sexta-feira, 30 de novembro de 2007

1970



Bye, bye, miss american pie...
American Pie - Don McKlin, 1972.


A equipe técnica é moderna demais
olhando o mundo detrás
dos óculos de aros grossos
de cientista no senso.
A Lua é a nova morada
do homem,
da NASA,
do casal de namorados,
ou, mais acertado,
dos lunáticos de plantão,
já que o mundo virou delírio
e tudo é muito impreciso,
como a moda que virou do avesso
e ninguém sabe pra onde vai.
Sim, tudo é futuro!
Tão futuro como num sonho.
O futuro chegou e abriu a porta,
entrou sem bater e sentou-se à mesa,
ultramoderna, com cadeiras de plástico.
A ceia é o passado e o presente,
servidos à moda da casa,
que já não tinha endereço,
"Não tinha teto, não tinha nada!",
como Vinícius cantava, na sua Arca...
E o que será o amanhã?
Incógnita indisponível!
Indiscutível, imponderável.
Improvável como um sorriso
do século XVI.
O mundo se dissolveu...
_E se dissolverá mais?
_E se transformará mais?
E mudará mais e mais
até acabar explodindo?
Até acabar se fundindo
numa chuva de napalm,
num grande Vietnã,
numa guerra nuclear?
Destruindo tudo e todos,
destruindo o tempo,
o futuro,
o agora,
o pra sempre?!
Para sempre!...
...........................

1970 é passado!
Acabado!
Mudado!
Passado...
"O sonho acabou!"
O mundo mudou!
Com o "futuro"... mudou!...



Marcelo Farias - Ultramodernidade. Ilustração - capa de Abbey Road, The Beatles, 1969.

FANTASMAS




À Cecília Meireles


Se fores de madrugada,
poderás vê-los bailar.
Fantasmas! Ao vão luar!
É só íres ao sótão,
ao quarto das coisas velhas
e olhares pela janela
seu vibrante celebrar
da vida que já se foi
e que nunca mais será!...




Marcelo Farias - Para Entender a Mágica. Ilustração: Ensaio - Edgar Degas.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

MY SCARFACE


Baixei umas músicas novas,
comprei uns cds e uns discos,
conheci umas pessoas,
nem dei alarme,
nem dei sorriso:
girei o mundo do meu globo,
sem sair do quarto.
(mas agora eu já aprendi a pular a janela).


I'm tourist, meet me in outer space.



Gabriela Nieri - Fragmentada

A LATA


A minha lata é redonda.
Tudo começa onde termina
e tudo termina onde começa.
O meio pode estar no fim.
O fim, por sua vez, no começo
e o começo em lugar algum.
Seu conteúdo é sólido e líquido.
Seu conteúdo é nada e tudo.
É feita de alumíno e papel.
Sua boca aponta para o céu.



Beto Reis

ISA "BELA"



Fadadas linhas,
que me rolam lágrimas.

Lágrimas de amor.
lágrimas.

Amor a uma pequena
vida... Isa...
Isa... Belle.

Anos de amor e carinho,
alegrias, sofrimentos e cuidados.

Hoje... distante.
Dói... saudades.
Constante...



Fernanda Reis

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Tempestade



Apesar do azul do céu,
Você a vê chegando.
Sabe que vai acontecer.
Sente na pele.

É previsível.

Mesmo que o dia pareça ensolarado.
Mesmo que os pássaros cantem.
A tempestade se anuncia.
O vento corre nas árvores.
Você finge que não vê.
Pois não quer.
Quer aproveitar as suas ilusões
Que o dia ainda está bonito.
Que vai ver um belo pôr-do-sol.

Ignora o vento, os trovões...
Até que o nascimento da tempestade lhe surpreende.
E enquanto o céu desaba,
A água escorre pelo seu rosto.

Você...
Estática.
Parada.
Surpresa.
Muda.


Como se não tivesse visto os sinais...
No seu rosto...
Chuva ou lágrimas?

Compondo-me


Rafael Pereira, estudante do CEFET/RJ e desenhista nas horas vagas, adaptou para os quadrinhos o poema de Me Morte "Compondo-me", que anteriormente se chamava "Eu me Amo" e ganhou novo título especialmente para o estilo (clique no desenho para abrir).

Compondo-me (Eu me Amo)


Hoje acordei assim
Libidinosamente minha
Recitei-me, poetei-me
Fiz melhor,
Me compus.
Hoje me olhei no espelho
E me apaixonei.

Pena que as paixões são breves...


Me Morte

BEAT



Á Jack Kerouac


Beatitude paira sobre mim.
Batiza-me com fogo e vida.
Com o ar que respiro fundo,
a plenos pulmões agora.

O céu seja o limite!
O horizonte o limiar.
Pois mil luas vou seguir,
como mil manhãs de sol.

Comerei a comunhão,
minha torta de maçã
com café que será vinho
_O sangue de Cristo, amém!

América, sorri pra mim.
Abre teus braços, teu ventre.
Deixa-me entrar nas entranhas,
nas estranhas terras índias.

Abre tuas highways, florestas
encantadas para sempre.
minha alma voa leve
e eu nem sei dizer por quê.




Marcelo Farias - Para Entender a Mágica

terça-feira, 27 de novembro de 2007

TERNO CINZA


Quando eu nasci não existia tempo.
O tempo era o presente
e o longínquo passado
presente nos contos de fada.
O tempo chegou nos 20...
Tempo em que minha elegância
me dava um ar responsável
de bom moço envelhecido.
Eu apaixonava funcionárias
e amava prostitutas.
Valia pelo que tinha
e pagava pelo que usava.
Dirigia meu automóvel
e consultava o relógio
(que não era de algibeira).
Bebia café e não chá.
Lia jornais e não livros.
Escrevia relatórios
e não poemas.
Eu era moderno!
Moderno como um terno cinza.



Marcelo Farias - Ultramodernidade

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

O VENCEDOR



Menino levado,
homem turrão,
esposo de Odete,
filho de Jõao.

Genitor de quatro,
pai generoso.
Quatro viraram treze,
avô bondoso.
Treze ainda são sete,
bisavô orgulhoso.

Homem de fibra.
Exemplo de vida.
Monumento.
Patrimônio vivo.
História em ação.
Lenda em nossa memória.
Ser altruísta.
"Veinho Batista"!
Modelo de amor.
Um vencedor.



Beto Reis

domingo, 25 de novembro de 2007

AS CRIANÇAS DO CEMITÉRIO (Children of the Grave)


Em 19 de novembro de 1647, durante a Revolução Inglesa, um pelotão montado de ironsides chacinou um grupo de quarenta crianças, que atiravam pedras durante sua passagem em uma estrada próxima à vilda de Windsor. O povo da vila, revoltado, armou uma emboscada para os soldados, no caminho para Londres. Armada com paus, pedras, facas, foices ou apenas as próprias mãos, unhas e dentes a turba trucidou inacreditavelmente o pelotão, a despeito das muitas baixas entre os aldeões. Ao fim da batalha, os corpos dos soldados foram queimados em uma imensa fogueira. Na manhã seguinte, as crianças receberam um funeral honroso no próprio local onde foram assassinadas, como se fossem guerreiras que merecessem ser enterradas no campo de batalha. A partir deste dia, os aldeões passaram a utilizar o local como novo cemitério, pois tornou-se uma honra ser enterrado ao lado dos "heróis pequeninos". Porém, tal honra aumentou sobremaneira depois que os cabeças redondas tomaram o poder e decapitaram o rei Carlos I, em 1649. Como represália pela morte do pelotão, Cromwell, ordenou à condenação à forca de todos os aldeões que participaram do combate.
Culpados e inocentes, contando um total de duzentos e quarenta aldeões foram enforcados ou mortos a esmo pelos soldados, que chegarram a arrastar os corpos de vinte deles presos a seus cavalos. Líderes da aldeia tiveram suas cabeças cortadas e expostas ao povo. Em longo trecho da estrada que ia de Windsor à Londres, os viajantes ficavam horrorizados com a fila de corpos dependurados pelo pescoço, sendo devorados pelos corvos, cobertos de moscas e exalando o pútrido cheiro da morte.
Mas de cento e quarenta anos se passaram e, em 1791, um viajante ilustre, Sir Callingan, que passava a cavalo pela estrada, pouco antes de alcançar o cemitério, declarou ter visto crianças correndo, rindo e escondendo-se entre as árvores. Era por volta da 01:00 hora da madrugada e Sir Callingan disse ter chegado a gritar para as crianças:

"_Vão para casa! Isso não são horas de crianças brincarem de esconder!"

Mal acabou de falar, foi surpreendido pelo abrupto silêncio e desaparecimento dos pequeninos. Seu espanto, no entanto, ainda não foi muito até este instante. Ao passar pelo cemitério, observou que muitas cruzes tinham datações muito curtas para a vida de um adulto. Concluiu então, instintivamente, que vira as crianças enterradas ali. Homem racional, no dia seguinte, em uma hospedaria próxima à Londres, comentou o incidente com o hospedeiro e os demais presentes. Mal começaram a ouvir a narrativa, seus rostos empalideceram e começaram a benzer-se.
Contaram-lhe então o antigo incidente da revolução e convenceram-no a certificar-se da história nos anais de Londres. Nobre, detentor de privilégios, Sir Callingan recebeu autorizaçãopara investigar os documentos antigos da cidade e não tardou a descobrir uma carta militar, datada do ano do Senhor de 1649, que narrava o incidente com as crianças e apresentava a ordem de Cromwell de retaliação à vila de Windsor. Pasmo, Callingan mandou rezar uma missa às almas das crianças em Westminster e nunca mais passou, nem de carruagem, pela estrada que liga Windsor à Londres, tal como narrou em seu diário.
Este, no entanto, foi apenas o primeiro relato famoso àcerca das "crianças do cemitério". Muitos outros iriam juntar-se a ele no decorrer dos cinquenta anos seguintes. Em 1848, uma enxurrada de relatos sobre as crianças do cemitério de Windsor encheram os jornais de Londres. Entre eles, o de uma senhora de cerca de cinquenta anos, Josephine Hammilton, professora primária que viajava de carro de Reading para Londres. Miss Hammilton afirmou que ao passar pelo cemitério, pouco antes de alcançar Windsor, apavorou-se após ter um repentino e macabro encontro com um menino:
"_Era um menino de cerca de onze anos, de cabelos longos e castanhos. Vestia roupas muito antigas, como as que só vemos em pinturas. Ele sorria maliciosamente para mim e tinha a tez pálida. Seu tom zombeteiro, longe de me irritar, me dava calafrios. Fiquei angustiada e desviei o olhar por um instante. Não mais que o tempo de um suspiro. Quando voltei a olhar o menino havia desaparecido."

Tais incidentes despertariam, dez anos depois, o interesse do jovem psiquiatra Adam Hughs, então com 33 anos, estudioso de fenômenos sobrenaturais, que mantinha freqüente correspondência com o francês Denizard Rivail (mas conhecido por seu nome espiritual, Allan Kardec). Hughs não apenas investigou a estrada, como entrou no próprio cemitério. Colheu inúmeros relatos de moradores de Windsor e chegou mesmo a montar acampamento, sem o conhecimento do prefeito local, com mais quatro auxiliáres no meio do bosque cortado pela estrada, para verificar se as visões não eram brincadeiras armadas pelas crianças vivas do vilarejo.
Passou três dias em vigília sem ver qualquer sinal de crianças, vivas ou desencarnadas. Aúnica coisa digna de nota para Hughs foi a incrível e inexplicável tristeza que se abatia sobre eles e seus companheiros, sempre no período que ia das 15:45 às 16:00 horas e a sensação de estarem sendo observados e acompanhados por "presenças inquietantes". Ao retornar a Londres, investigou os documentos que tratavam do episódio de duzentos anos antes. Espantou-se ao descobrir que a chacina ocorrera exatamente entre 15:45 e 16:00 horas (pelas horas do pôr do sol de outono) do dia 19 de novembro de 1647.
Depois de Hughs, vários pesquisadores, icluíndo o célebre Frederic W. Myers, da Society For A Psicho Research, estudaram o fenômeno das crianças do cemitério de Windsor, sem chegarem a uma resposta definitiva. No século XX, vários pesquisadores realizaram suas próprias investigações. Porém, os únicos a tirarem conclusões mais palpáveis foram o parapsicólogo Richard Wilbourn Jr. e sua esposa Susan. Em setembro de 1977, o casal instalou dez pequenos gravadores, junto com câmeras filmadoras (ambos os aparelhos colados com fita adesiva, junto a um relógio) escondidas em moitas e árvores no bosque, na estrada e no cemitério.
As câmeras não colheram nada que fosse considerado digno de mensão, porém os gravadores captaram bizarras risadas, frases e barulho de crianças brincando, no momento em que as câmeras não detectavam a menor presença próxima aos aparelhos. Captaram ainda assobios estilizados e até uma lúgubre e tristonha canção, cantarolada pela voz melancólica de uma menina. Richard e Susan relataram ainda que, na hora em que foram colhidos os estranhos sons, uma abrupta queda de temperatura se fazia sentir. Junto a ela, uma inquietante sensação de "presença invisível", acompanhada, por vezes, de uma profunda... tristeza.
Fora isso, declararam que tiveram muitos problemas com o súbito desaparecimento de pequenos objetos pessoais, como peças de roupa, relógios, canetas e sapatos que, por vezes, eram encontrados em lugares muito distantes de onde haviam sido guardados. Locais inesperados como a ponta de galhos de árvores, dentro de moitas e, várias vezes, semi-enterrados sob folhas secas. Os desaparecimentos pareciam mesmo típicas brincadeiras de criança. Com tudo isso, o casal não conseguiu fazer-se acreditar pela comunidade científica, que chegou mesmo a acusá-los de forjarem os sons.
Porém, em 1994, o psiquiatra canadense John Keynes, declarou à comunidade científica que, ao analisar as gravações do casal Wilbourn, constatou que as frases pareciam ridiculamente initeligíveis, como se fossem faladas em outra língua que não o inglês. Psiquiatra especializado em crianças com distúrbios mentais, Keynes logo observou que os sons não eram aleatórios ruídos produzidos por crianças com problemas, como a síndrome de Down, ou qualquer outro distúrbio, nem fruto de brincadeiras infantis como falar de trás para frente, ou em código, mas frases bem construídas e fluentes.
As gravações foram então passadas à análise do lingüista galês George Stenfield, especializado em dialetos antigos da Grã-Bretanha. Após três dias de criteriosa audição, Stenfield chegou a inusitada conclusão de que as crianças falavam no antigo dialeto da região de Windsor, dialeto este que não era mais falado e só aparecia em livros especializados. Declarou-se também espantado com tal fato, visto que ele mesmo levara dois anos para aprender, precariamente, a pronunciar as palavras de tal dialeto e que, crianças atuais jamais aceitariam o castigo de aprender uma fala tão gutural.
Stenfield frisou ainda que as abafadas vozes gravadas usavam o que parecia ser expressões populares. em um esforço de tradução, trancreveu algumas das frases. Elas diziam coisas comos:
"Josh 'Cabeça de Esquilo'... (intraduzível)", "(...) são 'cabeças redondas', Kay", "(...) no topo da árvore... (intraduzível)", "com o Diabo na ponta dos pés" (corram???...). E os mais impressionantes: "(...) a mulher 'cabeça redonda'... (intraduzível)", "(...) ela vem com o súdito do rei!". Richard usava cabelos longos à época da pesquisa e Susan cabelos curtos, pouco abaixo do pescoço.
Após a apresentação da análise de Stenfield à comunidade científica, houve quem defendesse uma manipulação feita por computador, logo descartada por especialistas, mas a Ciência simplesmente preferiu calar-se e esquecer o caso. Hoje porém, treze anos após o desfecho do último capítulo do bizarro caso das crianças do cemitério de Windsor, o psicólogo americano Paul Dawson voltou a analizar o caso, usando como argumento uma desafiadora pergunta à comunidade científica:

"_Que mente seria tão doentia, a ponto de construir uma mentira tão elaborada?"




Marcelo Farias - Estórias de Vovô Celestino. Gravura, cemitério de Charleston.

sábado, 24 de novembro de 2007

TIRANA



Foi num triste dia...
um frio sábado de julho,
que encontrei meu paraíso
e vislumbrei meu cativeiro.

Você chegou cedo. (Eu já estava lá!)
Como os primeiros raios do Sol,
aquecendo o ambiente,
tornando mais clara a vida.

Sua pele jovem e macia,
sentida num toque sem intenção,
me estimula a fantasia,
brota e aflora a mais pura emoção.

Seu lindo rosto brilhava!... (angelical)
Era a menina, a moça...
de riso puro, alegre, (jovial)
que de mulher se mostrava.

Ao ver seus lábios vermelhos,
minha boca lançou seu clamor.
Vaguei pelas linhas de seu corpo
e desejei sentir seu sabor.

Seu olhar doce e sedutor,
por instantes, de relance, viu o meu.
Sua voz serene e meiga,
o meu sonho (de menino) acendeu.

Seus cabelos de ébano, longos e lisos,
quais as noites que me dormem...
guardam sonhos de um prisioneiro.
Prisioneiro de si mesmo (o Homem).

Gestos suaves e belos,
denunciam sua pureza nata.
Trejeitos formoços e delicados,
anunciam a obra inacabada.

Um vestido longo e branco,
como moldura para arte,
cobria seu lindo e tenro corpo,
sem mostrar nenhuma parte.

Onde antes só havia tristeza...
choro, pranto e solidão...
habita, agora, uma deusa da beleza,
e esse lugar é meu coração.

Você é meu paraíso!...
O Éden há muito buscado...
O que quis, o que quero
e o que sempre vou querer.


Meu cativeiro e minha vida.
É tudo que sou...
Tudo o que fiz,
o que não fiz, ou deixei de fazer.

Mas, minha escolha já foi feita.
Meu destino já selei
e meu sonho acalentado,
sei que nunca mais terei:

Um beijo seu (bem beijado!)
e sem paz...
para sempre...
viverei.




Beto Reis

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

O CARÍUA


Eu quero falar sobre a Rádio Texas e o grande ritmo,
que vem da Virgínia agreste.
Fresco, suave, preciso ritmo.
Difícil e foda de levar.
Alguns o chamam "brilho celestial",
outros vulgar e vil do sonho ocidental.
Eu amo os amigos que uni
nesta jangada fugaz.
Erguemos pirâmides em honra à fuga.
Esta é a terra onde o faraó jaz.

Os negros na floresta gritam, emplumados:
_Esqueçam a noite! Vivam na floresta azul!
Fora do perímetro não há estrelas!
Fora estamos tomados, imaculados!

_Ouça isto!
Quero falar sobre as aflições.
Falar sobre a perda de Deus.
Sobre a noite desamparada.
Sobre a rara ceia das almas, rejeitada.
Falar da virgem de metal malhada.

_Ouça isto!
Nenhum perdão nos aguarda
se perdermos a alvorada.

Eu vou falar sobre a Rádio Texas e o grande ritmo.
Fluido, suave e louco, como nova linguagem!

_Agora ouça isto!
Eu vou falar sobre o Texas.
Falar sobre a Rádio Texas.
Sobre a noite desamparada.
Sobre o "pé na estrada".
Falar da virgem de metal malhada.



Tradução de The Wasp (Jim Morrison), presente em Para Entender a Mágica, Marcelo Farias. Ilustração: Jim Morrison, foto de 1970.

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

POETAS CINZAS

O Filho do Homem - René Magritte



Aos modernistas



Um parnasianismo concreto,
um simbolismo de gravata e paletó,
tomou conta do mundo após 17.
Os burocratas fazíam versos
no lugar dos nobres e plebeus,
cantando o desencanto do mundo azul,
ao viverem num mundo cinza.
Os anjos lhes davam saudades,
os cupidos acenavam amores,
plenos de inocência perdida.
É difícil ser moderno...
O escritório não promete amor.
Talvez as esquinas escondam bardos,
menestréis cantores de jazz,
negros como a noite e o asfalto,
que sustenta carros sem cavalheiros,
mas com cavalos.
Funcionários hábeis de escrita,
que assinam rubricas,
carimbam papéis,
lêem depressa o jornal
e documentos infindos,
os burocrtas escrevem bem.
Nos tec-tecs das máquinas,
no tic-tac das horas,
que caem sobre o cinzeiro,
cantam a certeza da morte.
Última instância romântica,
ultraromântica sempre!



Marcelo Farias - Ultramodernidade

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

DEVIR

Por que o coração bate forte
até nos fazer esquecer?
Por que manhã no spromete o azul,
ainda que esteja cinza?
Não saberei ser feliz?
Amanhã é um novo dia,
mas isso é somente uma frase.
Sábio é o que se contenta!
_sábio Fernando Pessoa.
Se eu soubesse ao menos conter-me...
Mas antes Jó do que Jonas,
ainda que à sombra do rícino...




Marcelo Farias - Ultramodernidade

terça-feira, 20 de novembro de 2007

INSETO


De antenas em pé,
busco minha identidade
nas páginas de Kafka.
Me sinto barata.
Não sou barato.
Queria ser mosca,
voar pelo mundo,
comer muito açucar,
zumbir!
E sumir...
Me esconder em gretas,
não mais ser achado,
não poder,
nem querer
ser encontrado!




Beto Reis

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

VASTA ADORAÇÃO

Nascimento de Vênus - Botticelli

Eis que me pego, novamente, contemplando o Olimpo
e vejo, pasmo! novas divindades.
Outras formas de beleza celeste,
outras modos de poder divinal...
Tollo mortal que sou,
vago pelas plenícies da antiguidade
e busco novo alento para minhas paixões.
Escrevo sobre Deusas,
sobre musas, sobre ninfas,
semi divindades que povoam
as mentes e os corações
dos que não têm a imortalidade
como requisito para sua denominação.

Tolo mortal que sou,
perco-me em devaneios puros,
e morro da mais caricata paixão...

Beto Reis

domingo, 18 de novembro de 2007

MULHER DA REVISTA















Teu olhar me domina por não conhecer-te,
por não conceber-te como alguém.

Eterna na tua condição de fada,

não tens nenhuma procedência,
não tens decência,
não tens idade.
Não terás nenhum filho.
Não casarás!

O mundo em que vives é esse:
o flat,
a praia encantada,
a piscina,
a sala de estar magnífica,
a cama!...
_Dimensão própria de ti.

Parfeita!
Doce!
Ilusória!...
Ilusão...



Marcelo Farias. Ilustração: Mel Lisboa - revista Playboy, 2004.

sábado, 17 de novembro de 2007

BALADA DO CARAPANÃ















À Elson Farias

De violino afinado
e negro fraque de orquestra,
voava o carapanã
pr'uma noite de seresta.
Deixando, todo elegante,
sua boêmia morada:
Pensão de Sapos e Incetos
- Laguinho D'água Parada,
pra tocar suas trovinhas
bem debaixo das sacadas
dos ouvidos da cunhãs,
que docemente embaladas,
dormiam langues, entregues
aos desejos do hematófago,
que as sugava qual vampiro
mal saído do sarcófago.
_Ó galante Conde Culex,
que reinaste nesta noite,
não percebeste que a Morte
já te traspassava a foice.
_É que o puto, embriagado,
resolveu a certa altura,
ler uma teia de aranha
pensando ser partitura.
Foi, ébrio, chegando perto,
para melhor constatar,
se aquelas notas brilhantes
eram de Mozart ou Bach.
Num tropeço, de repente,
enroscou-se na cilada,
que a engenhosa Papa-Mosca
mantivera bem armada.
C'um zunido de agonia,
despediu-se desta vida,
servindo para a aracnídea
de saborosa comida.
Foi somente de manhã,
que seus fraternos amigos,
encontraram seus despojos,
ressecados e roídos.
Fez-se cantoria fúnebre
no restante deste dia,
comovovendo à toda gente
que ao triste réquiem ouvia.
_Ó pequeno seresteiro,
tu não foste Paganini,
mas tua melodia fina
'Inda em meu ouvido zine!



Marcelo Farias - Para Entender a Mágica

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Era vidro e se quebrou

O amor acaba. Sempre foi assim e sempre será. O amor se perde, entre os dedos que já não se entrelaçam mais, entre um ou dois passos de dança. O amor desaparece no fundo de uma gaveta e – por mais brega que isso possa parecer – no fundo do coração. O amor amarela, entre um sorriso e um soluço, no meio do filme. No movimento da mão que procura outra mão mas mão já não há. Cadê o amor que estava aqui? O amor encolhe, murcha, anoréxico. Suicida-se enquanto eles dizem “Tão jovem!”. O amor se vai aos poucos, de gota em gota, pálido. Morre de velhice, de obesidade, de preguiça. O amor se vai, assim, leve... escapa, dissolve-se, evapora-se. No susto de um pôr-do-sol interrompido por uma buzina, na serenidade do olhar enquanto as mãos se beijam. O anel que tu me deste era vidro e se quebrou, o amor que tu me tinhas... cadê, meu Deus, o amor?

- Duda de Oliveira.

O RIO QUE PASSA ATRÁS DA MINHA CASA

















À Carlos Drummond de Andrade


Há um rio que passa atrás da minha casa.
Um rio afluente do rio que é subafluente do maior rio.
Um rio sujo, poluído...
Vindo não sei d'onde, que corre pra sei lá,
só sei que o rio se esconde
sob a lama que nele há.
Em dias de temporal ele transborda.
Sobe muito além da margem, como antes não subia,
pois só ia até a borda, nos tempos de antigamente.
_Ah, os tempos de antigamente!...
O rio que passa atrás de minha casa era um grande balneário.
Nele vinha muita gente tomar banho nos domingos,
dias santos e feriados.
É, mas passa o tempo...
E com o tempo enche o rio,
que encheu-se da cidade que passou por sobre o rio!...
Por isso, ele invadiu o terreno atrás da minha casa.
Depois, vazou pro meu quintal, pelas frestas do muro.
Num dia, bateu no batente da minha porta!...
No outro... entrou pela porta sem bater...
Eu tenho que cuidar do rio que passa atrás da minha casa,
senão, o rio que passa at´rás da minha casa...
vai cuidar de mim.




Marcelo Farias - Para Entender a Mágica

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

MARQUESA DE SANGUE


















Menina chechena coberta de sangue e poeira - Heuters


À Monteiro Lobato


Não foi tu quem de pirraça
fez bigodes de grafite
nas damas de Dom Quixote.

E não foi Tia Nastácia
quem pintou teu rosto triste...
com esta expressão de choque...

Teus olhos esbugalhados,
por teu sangue maquiados,
nunca viram a magia,
só a trágica alquimia
dos rojões da aviação.

Em teu sítio sitiado,
por cem mil canhões cercado,
não existe a fantasia,
mas a dor e a agonia
de quem geme sobre o chão.

_Ó, meu Deus, se tu pudesses
escapar ao cerco, enfim,
proferindo em tons alegres,
um simples pirlimpimpim!...

_Por Alá, por que não foges,
sobre a cauda de um cometa,
pra bem longe dos algozes,
pros sonhos de outro planeta?!

_Será pouco a violência?
_Será muita a covardia?
_Será tola a minha ira?
_Será pura?...

_Ah, mas basta!... Que tolice!...
E qual louco que me disse
que tu podes me escutar?
E qual louco que me disse,
que tu podes feito Alice,
da loucura despertar?

Não, não, não! Nem poderia...
Pois nem és aquela Emília,
Marquesa de Rabicó.
És antes lembrança breve
de um frio boneco de neve,
marquesa de sangue e pó...




Marcelo Farias - Para Entender a Mágica

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

LÚCIFER


















Quedo ao negro azul rotundo,
espelho sem aço ou fundo,
lagoa profunda e nau!

Cingro o mar da vira-volta
e pasmo no vôo revolta
a boca do monstro blau!...

Clamo ao céu! _Clemente céu!
_Dai-me a fada preferida,
se desvela e me convida
para a ceia de Vesper.

Quero a noite como noiva!
Quero a morte como vinha!
Seja Vênus a madrinha
do herói que vai nascer.

Que as estrelas _purpurina!_
se despenquem nessa hora
e que a Lua seja minha
cheia, branca, nua e mora!




Marcelo Farias - Para Entender a Mágica

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Brinde
















Bacanal dos adrianos - Ticiano


Brindemos aos deuses do amor, que nos deixam loucos,
E aos deuses da loucura, que nos conduzem ao amor.

Encharquemos nossas gargantas secas com as lágrimas dos que sofrem
E sequemos os restos de nossa libido solta com papéis de perdão.

Inutilizemos o mundo!

Brindemos, vamos, brindemos!

Tragamos ao mundo insano o amor, ao mundo amado a insanidade.

Enlouqueceremos quem ama.
Amaremos quem enlouquece.

Andem, brindemos!

Um copo de cerveja amarga, uma taça de vinho doce.
O travo azedo da desilusão, a euforia enjoativa da paixão.

Porque não brindam comigo?

Comemoremos!
Todos os que amam, sem esperança!
Todos os que esperam, sem amor!
Os loucos que amam. Os amores que enlouquecem.

Quebremos os vidros, vertamos os líquidos!

COMEMOREMOS!

Deixemos a bebida tirar nossos sentidos...

Para que possamos esquecer.
Definitivamente.
O amor que enlouquece.

A ÁRVORE















Ramos de minha vida,
que se espalham pelo ar,
rasgam o azul,
tentando tocar Deus.
Folhas de minha idade,
que caem ao chão,
tombam sem jeito...
tentando voltar aos céus.
Raízes de minha mente,
que buscam, cada vez mais, o fundo,
a amplitude do infinito
e tentam encontrar,
no âmago de mim mesmo,
as razões que me fazem único.




Beto Reis

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

A PORTA




















À Carlos Alberto Tinoco


Bati três vezes na porta,
para ver se alguém abria...
Não abriu.
Passei a chave na tranca,
para ver se ela se abria...
Não se abriu.
Disse três palavras mágicas,
para ver se ela atendia...
Nem ouviu!
Tentei então arrombá-la!
Ela riu!
Cansado, voltei-lhe as costas...
Ela abriu!



Marcelo Farias - Para Entender a Mágica

domingo, 11 de novembro de 2007

RÉPLICA AOS ESTILITAS



















O Céu é o Inferno de cima,
onde os anjos são castrados.
Pecar é mais puro que a morte,
pois nos faz sentir com vida.
No Inferno há fogo e luz
e o calor de almas quentes.
O santo é o coveiro de si
e jaz sobre uma coluna.





Marcelo Farias

sábado, 10 de novembro de 2007

VISÃO
















Sob o céu acizentado de meu ego
repousa a paisagem isólita
de luzes... de sombras,
de silêncio e vozes...

Pelos cantos dos meus olhos
escorrem gotas...
Os seres próximos são de ébano caiado
e os distantes são pedras intocáveis.

Busco resposta para meus atos,
mas só encontro estática...
Vagos suspiros pensantes
formatados de modos impensados.

As linhas se contorcem,
infinitamente corrompidas:
Cada pessoa é um ser manipulável
e cada manipulação, uma vida.

A vida se confunde,
como tela a nos prender,
segurando o homem rude,
dando a ele o que temer.

Senhor, sei que escreves certo
por linhas tortas e, com uma lucidez
alucinada, me coloco
em tua "caneta divina"...





Beto Reis

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

CAVALEIRO



















Empunhando minha espada de ilusões,
enfrento o dragão de meus temores...
A fera secular que habita meu interior.
Com o escudo da minha vontade,
defendo-me do fogo da ignorância
que ameaça consumir meus sonhos...
minha ilusão e meus desejos mais profundos.
Meu elmo protege minha cabeça... minha mente...
dos ardis de um mundo místico,
mas que prega a razão sem fim.
Busco a lança do saber,
esperando, com isso, proteção...
defesa contra os ataques do meu monstro interior.
Porém, ele me ataca de modo fulminante!
Devastador!...
Me ataca por dentro,
minando minhas defezas, a partir de suas origens...
e me destrói...

E serei mais um cruzado,
perdido na minha própria Idade Média!




Beto Reis

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

AGORA É BRINCAR DE VIVER















Houve uma época, há mais de vinte anos atrás, em que uma geração de crianças, pré-adolescentes e adolescentes, já viciados pelo vídeo game (que então surgia) e portadores de uma imensa preguiça quanto a leitura, tiveram sua ignorância compensada por professores nada convencionais: os artistas! Sim! Vinícius de Morais foi o primeiro desses professores, com sua Arca de Noé, exibida em forma de especial da Rede Globo em 1980. Vinícius não ensinava matemática, português, história... ensinava uma outra matéria, tão fundamental em qualquer época e absolutamente esquecida nos dias de hoje: sensibilidade!
Com o sucesso da Arca... a Rede Globo resolveu repetir a dose apresentando outros especiais do mesmo tipo como Pirlimpimpim!!! (1982), que trazia a célebre canção Balão Azul, que acabou por virar tema do programa infantil Balão Mágico (1983-1986). Em 1983, Plunct, Plact, Zoom encantou o público infantil e até o adulto com canções como Brincar de Viver, de Guilherme Arantes, tão magistralmente interpretada por Maria Betânia.
Mas hoje a sensibilidade está do lado de fora. Não lhe permitem entrar nem na TV, nem em lugar nenhum. A juventude é bruta e brutalizada. Amigos, em verdade, em verdade vos digo: o verdadeiro aprendizado se dá no coração! Por que os grandes artistas de hoje (Skank, Cachorro Grande, Pitty, Seu Jorge, Ana Carolina e outros) não se reúnem para fazer um novo programa de TV assim? Milhões de corações agradeceriam.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

















Se uma gota de mágica
caísse na minha mão
agora eu não saberia
medir sua profundidade.
Que coisa misteriosa!
A noite é negra e azul.
Como pode voar além
a coruja que conta as horas
na sala de minha casa?


O VINHO RESPONDERÁ
Marcelo Farias - Para Entender a Mágica

terça-feira, 6 de novembro de 2007

PANDORA



















À Astrid Cabral


Absurda, ela abriu a caixa!
Como Zeus disse pra não,
Pra nunca fazer. Jamais!

_Pandora, minha Pandora,
por que não obedeceste?...

Voaram de lá de dentro
Mil asas de sofrimento,
de angúsita, de dor...
_Lamento!...

Pandora quedou, culpada.
Não pode fazer mais nada...

_Bam! Bam! Bam!...

Que castigos sofreria?

_Bam! Bam! Bam!...

Que castigos?...
Sofreria?...

_Huuu-mimmm...

Seu choro chupou sentenças!
Mil formas de dor!
Cem penas!

Mas bruma brotou da caixa,
pairou sobre sua cabeça,
de tola menina, baixa...

_Não chores, meu bem, não chores!_
Disse a voz de uma esperança.

Suave, sentiu um beijo.
Pandora ergueu a cabeça,
enxugou os olhos,
sorriu!...




Marcelo Farias - Para Entender a Mágica





segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Soneto Balão


Livre, leve, solta
E amarrada ao chão
Por que nada a fazia sonhar,
Flutuar, divagar

Dentro de si
Segura o suficiente
Pra abrir a boca
E calar a multidão

Pouca gente percebeu
Que seu sorriso, porém,
Andava mais implícito

Dizem que não foi o caminhão;
Foi tudo por causa
De um coração partido.

sábado, 3 de novembro de 2007

...




















Que venham os anjos
Que tragam a salvação
Que levem o ódio
Que tragam o perdão

Que venham os demônios
Que tragam o fogo
Que tragam o poder
Que tragam a dor

Que venha você
Que me tire a salvação
Que queime o perdão
Que force a dor
E que consiga finalmente
Saciar o meu amor.

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

TRANSE




















Transe que abre a mente
retira as travas,
os bloqueios.

Transe que inspira,
faz escrever,
transcende.

Transe que ilumina,
clareia as palavras
e faz de mim
homem caricato,
poeta do mundo
da vida!


Beto Reis

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

TORPOR




















Olho para mim mesmo
e vejo o reflexo difuso,
a imagem retratada
da figura desolada
que busca um "porquê"
de não ter a sua amada.

Olho para mim, ja refletido;
ser caricato e descabido,
agindo pelo impulso de sonho
e essa busca inconstante
faz-me um palhaço... um bisonho,
que acha que não é, ainda, o bastante.

Olho para mim, indefinido,
vivendo um sentimento escondido,
cálido, quente e impetuoso,
nascido de um olhar devastador,
firmado no tesão de seu calor.
Pleno sonho vivdo... Torpor!



Beto Reis