domingo, 28 de fevereiro de 2010

Moldura.

Rembrandt,
ao escalar a parede de minha cama
escureceu os pincéis,
enquanto seus pés suavam
gotas acima de minha cabeça.

Seu tambor e seu cachorro
perdoavam melodias (como as uivadas)
plenamente em noite escura.

Há quem esteja um passo à frente!
Suavemente, as lanças no ar
desenham a batalha - instantes -,
desdenhando-se à desconfiança
do anjo branco que olha pra mim!

Perdoa-me se essa és Saskia que o espera
com as flores ordenhadas,
ordenando a paz de flora.

(Seu rosto é quase a musa de Vermeer sem as pérolas.)

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

SAÍDAS DEVORADAS
















os cães ladram nos portões da frente.

seus indomáveis olhos acesos
citam

Ginsberg e Dylan Thomas.
uivam os próprios nomes

e ganem sobre os nervos.
agarrado aos segredos amáveis,

aos senhores admiráveis do tempo,
os observo pela janela;

a caneta febril
querendo histórias,
roupas de couro,
danças dionisíacas
e abraços...

o lápis egoísta
segurando a vida,
a canção,
o contra-urro,

impedindo o xamã
de bailar
ao redor da mesa.

vomito poesia,
imagens contorcidas,
sangue,
demência:

- qual destas sou eu?

o amor
em verso e prosa
vocifera

e fere ouvidos
e narinas:

- doce fera acústica!

nas frestas a carne crua,
esconderijo de demônios,
reza rijos sonhos empedrados

(remédios e calafrios)

os cães ladram nos portões da frente;

unhas de ferro
no quadro negro
riscam e arriscam
um arisco adeus.

acidentes coletivos
matam formigas,
humanos e peixes,

feixes atômicos,
quedas sinfônicas,
parlendas:

a morte não mora
no cercado da fazenda,

não vive de renda,

não emenda uma vida em outra,
{não corre no hipódromo
[espezinha delirantes veias abertas
(não desfila no sambódromo}
os mortos só cabem no fundo da vala])

o céu é dos vivos e atrevidos,
dos jogadores,
das putas bêbadas,
dos sifilíticos em transe,
dos leves e loucos.

os cães ladram nos portões da frente;

arreganham seus dentes brancos,
mordem as grades do pensamento
e informam que as saídas foram devoradas.



Anderson H. Ilustração: cena do filme Sonhos (sequência initulada O Tunel), coordenado por Akira Kurosawa.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

FATÍDICO























Se eu perecer, perecerei

aliás, eu e o rei persa
de carocha endiabrados

sabemos, não vamos durar

mas não temos pressa
e esperamos sentados

pelo indômito inevitável...



Lanoia.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

LOLITA LOLLIPOP

















Lolita Lollipop tem 14
e está no terceiro ano de sacanagem.
Lolita Lollipop é ídolo pop
dos onanistas do ginásio.
Lolita Lollipop é seu terceiro apelido
neste segundo bimestre.
Lolita Lollipop tem uma saia curta
e um professor babão.
Lolita Lollipop é maestrina
em trabalhos manuais.
Lolita Lollipop é uma sacana
quando jura que me ama.
Lolita Lollipop não me chupa
há três semanas.
Lolita Lollipop está prenhe de idéias,
quer o bad boy da turma.
Lolita Lollipop casará aos 16,
terá três filhos aos 21...
Lolita Lollipop deformada pela maternidade
e tatuagens de caveira.
Lolita Lollipop ganha as páginas dos jornais:
Morta aos 22, por uma PT-40!...


Artur Farrapo. Revista Sirrose IV.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

A MULHER INFIEL


















A mulher infiel anda pela rua coberta de rosas.

Sente sua saia dançar
com uma brisa limpa e leve
vinda do interior de uma alma cheia de tudo que somos
e também deixamos de ser.

Uma alma que é sua
Uma alma que ela nem usa mais.

Sente sua blusa azul e amarela
destacando o que deveria esconder.
E o seu cabelo
preso em uma fita cheia de flores coloridas.

Não ouve a voz que dentro dela
Grita
Esperneia
Implora por atenção; bate o pé irritada.

Com suas unhas discretas ajeita o cabelo
E retoca com vermelho a boca fechada,
tão pequena.

A mulher infiel finge não saber de toda dor
que passeia pelo seu vazio e espaçoso coração.

Melindrosa,
ela corta praças e parques
e ruas movimentadas,
entupidas de todos os ruídos tristes deste mundo.

O sorveteiro lhe serve creme com morango
e além de moedas aquecidas
recebe também seu melhor sorriso brejeiro.

A melindrosa mulher infiel
percebe.
E sente
como o sopro de uma mãe sobre o joelho esfolado;
a melindrosa mulher infiel
caía por todos os lugares
todos os dias
há tantos anos.

Logo
A dor volta a gritar,
passeando frenética.
A voz esperneia,
querendo atenção.
A cabeça pesa, vazia
fazendo-a enganar-se que é a fita de flores coloridas
apertando-lhe os pensamentos.

A mulher e melindrosa infiel
segue pela rua coberta de rosas.
Uma fita cheia de flores coloridas no cabelo
Uma blusa azul e amarela e
uma saia cheia de vento.

Ela não quer escutar.

E pelo seu coração vazio
passeiam livremente
todos os homens
e todas as dores
Deste mundo abarrotado de coisas e amor.


Jana Lauxen

sábado, 6 de fevereiro de 2010

VIAGEM





















Na viagem que eu tive
Os sopranos não sopravam mais
E os tenores
só temiam o silencio
que preenchia a sala

Era tanta ausência,
Tanta falta, tanto quarto,
Tanta cama
A chama se apagando
Em cada olhar, em cada trago
Em cada sopro

E a ventania chamando ora pra leste ora pra oeste
Na viagem que eu tive
Os sopranos só sopravam
E os tenores destemidos
Recitavam aos pardais

Versos curvos
E o silencio não preenchia mais...


Jair Fraga V. Neto & Debora Tieppo

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

O PECADO DA MENINA MULHER























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papai, pequei! foi tão gostoso e tão cheio de culpa que pensei cá, com meus botões: "dancei". mas não deixei barato como Eva porque pequei mais do que há de castigo pra pagar. e gostei. ah papai, me judia, me quebra a cara, me senta o cinto, me queima o couro... mas não pela tentação que sucumbi, mas pelo modo sutil com que olhei pra mamãe pra dizer que gozei...

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Leonardo Spoke Quintela