terça-feira, 4 de março de 2008

ESQUECE - Ou, a metafísica do casamento

















Essas coisas me deixam cansada da vida, sempre que vejo no espelho... O que tem o espelho, mulher? O espelho, o espelho nada. Mas olha pra mim, olha pra mim e me diga... diga... Dizer o que? Que hoje você acordou toda... Toda o que? Fala! Acordei toda o que? Por que você não fala? Acordei toda o que? Você é muito assim... Assim como? Assim, meias palavras, palavras e meias. Nunca diz nada de real valor! Você também! Eu?!... Sim! Você sempre vem com ladainha, resmungando, se lastimando! Mas eu só quero que você olhe e me diga! Dizer o que? O que quer que eu lhe diga? Se vai se sentir melhor eu digo, porra! Não precisa ser rude! Não dá pra falar com você! Um... um... Um o quê? O que sou agora? Eu estava quieto, quieto no meu canto. Você reclamando com o espelho, ou do espelho... Acho que devo ser padre, ou psicólogo. Eu só quero ficar quieto, ouvir o som do nada. Não ri... não ri... É sério!... Ri! Parece louca! Ah! Viu, me acha louca! Claro! Claro que acho! Me olha, não me beija, não me toca, mas me interroga de coisas abstratas, sem fundamentos, cheia de metafísicas! Sai fora! Num dá! Você quer que eu diga o que? Fala que eu te digo e pronto! Assim você sossega! Sim, mas deixa pra lá! Não sei mais se é da gordura ou das dívidas. Esquece.




Flávio Mello.

3 comentários:

MARCELO FARIAS disse...

Luís Fernando Veríssimo escrevendo o Analista de Bagé. Só falta a turma do Asdrúbal para encenar.

MARCELO FARIAS disse...

Isso é um elogio.

Ana Kaya disse...

Nossa, que descrição perfeita de um casal.
Me vi olhando num espelho, não as mesmas palavras ou os mesmos problemas, mas a mesma situação, os mesmos sentimentos, o saco tão cheio.
Ninguém faria melhor.
Parabéns, aplausos.