quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Pronominadas

não ver-te
é um erro tão gramatical
quanto perder-te.

mas da gramática
cuida aquele que não vive
do coração,
não vive.

eu vivo num mundo que aflora.
passo horas a contar estrelas,
ver a lua,
olhar
o velocímetro e o farol
com o qual viajo.
eles pouco me mostram.
têm lá seus momentos
mas a estrada fica sem lume.

os gramáticos
e os acentos circunflexos.
meu rogar genuflexo.
quem mina mais
ainda é a estrada
pois tu não corres.

volto à próclise
e ela nada me diz
não me contenta
me contunde
como a ausência.
meu mundo faz minha mesma viagem.
estou a ponto de esquecer
a estrada,
pouco iluminada,
não é nada.
o problema é viajar.

quando eu tinha coerência
as placas eram guias.
hoje, tudo isso é apenas entorno sem razão
e eu palpito
mais que o motor violento que me leva ao sabor do acelerar.
tu me fazes não ter coesão
e eu gosto desse
detalhe.

as pessoas dirão que estou louco,
mas a verdade
é que, quando chegarem,
já estarei novamente na estrada, pois só
ela
me faz feliz
quando não estás no banco do passageiro mantendo-me desperto.

sonho em ainda te ter na estrada,
ao meu lado,
dizendo que a viagem assim faz sentido.
mesmo que vaguemos sem rumo
que já é rumo certo quando pegas minha mão.

quinta marcha.
aperto o passo e acelero.
um carro de farol alto passa,
dou sinal,
ele abaixa.

a gramática das placas e a minha gramática
todas inúteis
cerebrais
objetivas.
e o ideal onde está?
faz-me perder o rumo, oh flor do acalanto.
canta-me a canção que o vento
leva.
enxuga o suor tropical de minha fronte
ame-me como te amo.
tudo assim vai se acertar.

ontem quando adormeci
não vi a estrada,
sonhei gramaticalmente certo
pois dar-te-ia mesóclises no futuro.
e tu,
sem querer,
negaste-as, já sendo ênclises.

estrada, colocação pronominal,
estrelas, lua,
gramática.
orações coordenadas desordenam minha alma.
subordinadas relações me subordinam.
oração principal.
a oração principal é conjugar o verbo devido.
quisera-te queria-te quis-te quero-te querer-te-ei querer-te-ia.

Diálogo Poético de Namorados Sobre Guarda-Roupa


- "amor,
despe minhas vestimentas,
que escondem no bolso
meus medos
e pensamentos,

tentam, como quem
costura e (re)emenda,
fazer da realidade
pesadelos.

amor,
estes são os que
nunca levarás contigo
para cama,

as causas da minha tormenta".

- "que bom, meu bem,
prefiro você nela,
nu, quente e suado,
dizendo que me ama".

- "por isso que eu te amo, porra!

mas como não são poucas,
pega todas elas
e guarde-as numa sentinela
de indesejadas roupas".

André Espínola

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

NO VINHO ESTÁ A VERDADE























O vinho é um
reverencioso
desvanecedor da timidez.
Precioso alvoroço de festim!
O vinho é hilariante
e circula em nossos corpos
provocando uma dança,
fazendo o pensamento bailar!
O vinho decreta
que a dança seja permitida
e que a descompostura
do bailariço seja
a travessura da elegância.
A dança se reúne
com as gargalhadas explícitas
da em briaguez.
Inclinação indispensável
para cantarolas de poemas
românticos
e músicas estonteantes.
Belíssimo rosto mantém
os olhos arraigados
em minha boca
e o sorriso deflagrando
felicidade total.
Fico curioso, mas prefiro rir!
Risos compulsivos
e sem cerimônia!



Edilson Seta - Sirrose, edicão VI. Ilustração: Jovem Baco - Caravaggio.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

SURREAL























Da faca, nem sabes a ponta.
Eu me atrevo a cada moita,
cotia arredia, bicho do mato.

No regato a chuva chia mansa.
Olho pedras e pedras rolarem.
Me ponha na ponta _pés descalços.

A roupa, pouso no chão,
a água fria me veste,
arrepio e no fundo transito

sua alma, que chora, me cola.
É branca e fria sua cama
e vermelho seu desespero.

Não sabes de ninguém
ser um. Único em meu sonho...
_Alerta de um perigo (gostoso).




Ivonefs.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Desabafo



Sou assim,
Então me deixe sangrar.
Talvez confundam meu sangue
Com o odor desse maldito,
Que em pensamento matei
Com requintes de crueldade.
Enfiei a faca no ânus
E contorci, rodei, girei, morri em meio ao sangue.

E nada disso te trouxe de volta...


Me Morte
( Pedofilia É Caso De Polícia!!!
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=15370827
Cadeia neles!!!)

FOTO EM ARQUIVO























Uma mulher às vezes desvaria:
há mais de um mês,
prometi a mim mesma
não mais abri essa fotografia.
Não mergulhar no seu olhar
desconsertantemente franco
sobre o casaco de listras
em marinho e branco.

E a esta altura estou pouco me importando
se todos sabem de que foto estou falando.

E nem vou ajeitar
estas rimas ruins:
ficam assim.
Que fiquem como estão.
Isto não é poema: é confissão!

Tranquei a pasta desse arquivo com cuidado,
dei-lhe uma senha impossível de lembrar,
quis deixar tudo mesmo muito complicado,
impedir meu próprio acesso. Que ilusão!...

Agora, de um espaço dentro de mim desconhecido, recôndito, remoto,
salta o seu olhar num sobressalto
sem precisar de senha nem de foto.




Betty Vidgal. Ilustração: Retrato de Jacqueline - Pablo Picasso.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

TEXAS - 1963















Blasfemava, enquanto o crânio regurgitava os miolos do marido, não contra as diretrizes da política bélica e nem da fragilidade republicana - como fizera anos atrás - mas pela demora em lhe providenciarem um balde.



Muryel. Ilustração: Assassinato de John Kennedy.

OUTRAS MANEIRAS DE SER























Emmimeu,
cansado de estar dentro,
comeu penas de pardal.

Preso em si,
logo morreu:
passarinho
rejeitador de gaiola.

Depois Emmimeu
gozou ser rabiola
de pipa.

Voooooooou aaaaaaaalto...

mas tinha linha,
prisão de cerol!

Ares só nos dias
de vento e sol.

Era quase sempre chão...

Cansou-se!

Transmutou-se em ponta-pé
e foi feliz pela eternidade:

Tiro de meta batido
por sobre os tetos
da cidade.




Anderson H. Ilustração: pintura de René Magritte.

SUBSTÂNCIA DIÁFANA



















Sob o céu fachado,
escassez e inquietude.
E no escuro vejo
o que a luz escondia.
As coisas que são
e ainda não são.
Uma única flor,
vermelho vivo!
me cobre
e debaixo dela
me enfio,
percorro quilômetros de areia
e quando pouco...
penerando o deserto,
engatinho e atravesso
a janela do meu sonho.

Verei o que encontro...




Ivonefs.

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Louco eu, louco você...



Duda Bandit:
Não sei se a consciência
Toma-me de assalto
Ou se o assalto no farol
Rouba-me a consciência.
O fato é que julguei
Ser louca, ANORMAL,
E te encontrei bem mais.
Não satisfeita sorri,
Um sorriso besta,
De alvos dentes,
De insano som
E te obriguei
Por alguns instantes,
A me ler...
Serei normal?
E tu?
Etc...e tal?
Não sei...

O BAILE























A morta está mansa,
bem contida no gelo
que sobe dos pés
às narinas, cabelo...

Pede uma dança!
à chama da vela
que ao vento balança
entre o azul e o vermelho.

Já na contradança
o sangue é mais lento
a sair pela testa
e a buscar o degelo

da morte que avança
pelo meio da festa
e que some no ralo...

o ralo que resta.




Anderson H. Ilustração: La Magie Noire - René Magritte, 1935.

CONSAGRO AO DESERTO MEU DESEJO
















*

Vesta e vestais
um temporal
Vento e fogo
cidadela
areia e água
vergonha
atrito
tagarelas
enregelados
sentidos
retina
branco
translúcido
alma
corpo
espedaçados
impotência
lúcida
de um fim
apego
desapego
entre meio: indiferença.
duas vidas
inflorescência
entre a vida
entre a morte
além do desejo
o amor
expansão

... seus pés deixam pegadas leves e rumam...




Ivonefs. Ilustração: rosa pintada por Salvador Dali.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Tenho aprendido a ser

Meio gente
Carne, osso, coração
E espelho
A fim de não guardar
As coisas refletidas.

- Duda de Oliveira

SACRIFÍCIO
















A alma derrama,
escorre em disperdício,
isso é sacrifício.

Espia o crime,
assiste o filme
de outra história.

Vaga, indga a presnça,
assente transparência,
és vidro lapidado.

Ressente a mente,
espreita, espreme e geme.
A ceifa insere a cara.

Rara beleza presente,
olhos sem desvios,
poços de alívio.

e o cio sem ninho,
rios em desníveis,
ululam suas amarguras.

Antes libações
que a dor converte
em pura necessidade de ter.




Ivonefs.

domingo, 20 de janeiro de 2008

Todas as andorinhas andam nuas...



Me visto de sangue...

Ando sozinho...
Todas as andorinhas andam nuas
Todo horizonte é como a lua
Intocável

Me visto de ódio....

Vou perseguindo
Velhos inimigos invisíveis
Belas lutas sempre invencíveis
Falta coragem...

Me visto de Trevas...

Trago o rosto marcado
Dos meus dissabores, de tudo
E todas as dores do mundo
Trago nas mãos
Na solidão
No viver...

Me visto de choro...

Ando sozinho
Sou como a lua
E as andorinhas
Só andam nuas

Me visto de amor...



Me Morte

sábado, 19 de janeiro de 2008

ALHEAMENTO






















Por favor não se impressione
se eu não estiver presente,
pois presente eu nunca estive.
Perdoe se acaso falto
ao encontro a que compareço
e ao teu lado esqueço
meu sorriso antes de ir.



Marcelo Farias - Ultramodernidade. Ilustração: escultura de Magritte.

UM POMBO MORTO


















Percebe-se que caiu muito mais que pingos gordos e pesados de chuva, ou tempestade, o que se tem é muito mais que vento frio e humidade escorrendo junto ao embaçado dos vidros dos cafés pode-se ver, sentir, até quem sabe apalpar um tempo escuro e virulento, como momentos antes de uma tragédia iminente.
As pessoas passam esgotadas em tempo, não param, não olham, muitas quase que atroplenado gritam, ofendem os condutores, outras tantas se desligam de tudo e se adentram emaranhados de sofreguidão, não reparam na obras de arte espelhadas pelos cantos da cidade, os prédios, monumentos, propagandas, não reparam nos pingos que caem como resquícios de orbes infinos.
Mas o que vem do céu, não são somente grandes pingos, grandes esferas líquidas de cristal, percebe-se após um estouro, um só surdo, grave, um som de disparo,arma de fogo, o que caiu junto a esses pingos são penas, dezenas de penas acizentadas.
As pessoas passam, não reparam, as pessoas se vão, não notam, mas no chão jaz um pombo morto, um pombo morto que o medingo afoito destrincha imaginando ser seu almoço.



Flávio Mello - Seleção Natural.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

PSIQUE























Ah! se tu me veres a ponderar
a ponte efêmera do sentimento da paixão
e porfiar sua queda quando provado o amor pomposo,
o célebre pitoresco que não se vale de regresso,
regozijando-se no místico tornar-se-á sincero...

Olhe em meus olhos a chama rubra que envaidece,
prova-te da tua prova de discórdia a menina que neles reflete,
corta da tua boca a frase nula de que não me abrando e
apaga de tua psique o pensamento de que não te amo...



Yzzy Daniel. Ilustração: O Rapto de Psique - Willian-Adolph Bouguereau (1895).

PAISAGEM SURREAL


















Na boca da noite,
a chuva quase extinta
vem e castiga
escuras esquinas
na boca da noite você silencia.

No viaduto: automóveis.
À noite os donos são mendigos.
Supra-sumo do paradoxo,
obras do ópio são pontes do por vir!
"Claude Dali"!

À noite eu te descubro sem querer,
vejo a verdade sem te ver,
bela paisagem do perfeito surreal.
É natural mas fede.




Tirson B. Mesquita. Ilustração: Viaduto do Chá, São Paulo, à noite.

ENCONTRO DAS ÁGUAS
















Tua língua
na minha

influi

em cores e versos

azul-esverdeado
ocre-argila

_nus, embriagados _

seria...

Amazonas e Tapajós?


Ivonefs. Ilustração: encontro das águas do rio Tapajós com o Amazonas.

MIRAGEM















*

As asas imensas
que transportaram
voaram Saaras.

As árias intensas
que a conduziam
calaram Marias

das Dores,
das Graças,
das Virgens

_na areia solta
pegadas das caças

tudo miragem... será?

Em que pesar?
Onde pousar?

A alegria se revira
até os dentes
e se contorce.

O peito tomba
e a boca beija
o que encontra:

_Um solo árido,
desaponto,

em tese _Já é muito tarde
nada peça!

e seu grito... era dentro.



Ivonefs.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

ALÉM DAS PESTANAS DO CRIADOR























Não levamos,

não trazemos:

_Tragamos!

pela fumaça da memória:

vai o filho
que parou
de pular na cama
porque cresceu
sem avisar,

o cão amigo,
que de tão velho,
já nem se lembra
de abanar o rabo
magrelo e doente

e o canário
que não mais visita
a janela da sala...

ele não canta,

minha avó
não fala

meu assobio
de forma remota.

Para os afastamentos reais
praticamente tudo importa,

desde o refrigedor
que pararam de fabricar
nos anos cinquenta,

até a última porta
ultrapassada
por Adous Huxley
de forma

monótona,

lenta,

na festança
do terceiro colegial.

Qual era mesmo o gosto da virgindade
e a cor da banalização do querer bem

A vida é um imenso trem cargueiro que se afasta continuamente das estações

principais

e segue para além das pestanas do criador...



Anderson H. Ilustração: iluminura medieval mostrando São Jorge matando o dragão.

ANTRO


















Moro no antro
da alma turva,
descasco pecados
com minhas luvas
de quem esqueceu
que não tem mãos
para incendiar o céu.



Rita Medusa.

EM TI REPOUSEI















*

Sou refém sem algemas,
acaso vês?

Não saio do lugar
e tremo e temo.

Em cada dia circulo
no antártico brumado
esquecida

e gelo e gemo

presa de teus olhos,
presa de tua ausência,

presa em espera
diante de portas cerradas

num fio que me corta
tão fino tilinta...

...em ti repousei
e nem te sei.



Ivonefs.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

DO CONHECER CONCRETO























Conheço os pedaços da casa,
que gemem ao peso do corpo

e o estalar uniforme
e rouco
dos móveis de junco.

Conheço o rubicundo silêncio,
que adorna as paredes contíguas
e o ranger
das portas novas
de madeira antiga.

O choro grave das janelas
e a ação constante do vento
já são das vis aquarelas
um vil elemento.

A gravidade
que vai sobre os pregos,
que dormem na sala da frente,
já são tão ou mais importantes
que os próprios batentes.

Conheço a telha que vê,
mas cala, por caridade,
ante o pio indolente
do afeto e da realidade.

Conheço a ferida aberta
no teto e na minha mala
e a vala
que abriga os sonhos
no nosso quintal.

Mas a ti, meu amor,
a ti, que moras comigo, conheço,

mas conheço muito mal!



Anderson H. Ilustração: Casal - instalação de Magritte.

Semen(te)



















*

Sêmen,
prazer que fecunda.

Do sonho, proponho o filho que quero por nome Antônio,
Derrama, sagrada semente, que engulo em doses.

Do beijo, desejo a fome que leva a ter teu desejo.
Em mim, nas minhas espumas, encontrarás teu berço.

De ti nasceu Afrodite
que mora em mim.




Ivonefs.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Dai-nos


A noite corria pela janela
E os anos pelos meus dedos.
Enquanto milhares
Oravam a Ave Maria,
Eu me prostituia,
Com a cara e coragem...
E amontoava o pão de cada dia.
Profana sacanagem.
Que bobagem!

O EGITO NÃO É HABITADO


















Segundo a história oficial,
todos os habitantes do Egito
morreram num maremoto
ocorrido
no mar Adriático,
por volta de 6.000.000 de anos
antes de saçi pererê
perder a perna.

Foi nessa mesma época que Sócrates,
utilizando de Diógenes a lanterna,
descubriu a luminescência do dia
e marcou seu primeiro gol de placa!

Quem diria que essa putaria toda,
enviesada pela moral apócrifa
dos semi-deuses putanheiros
da Avenida Rebouças,

acabaria com uma civilização
praticamente feita de bêbados
e maconheiros.

Aliás, os egípcios inventaram
a louça e a cocaína,
o sexo anal e a endorfina,
o maracanã e os índios semióticos.

É tudo física quântica
na balança do tempo...



Anderson H - Olhos de Ampulheta.

VAIDADE OU REFLEXO























Sabe uma coisa que tenho pavor, terror?... Espelho,
embora muitos o tenham como amigo.
Olhe uma vez, ele te olha de volta,
com a mesma amplitude, acuidade e magnitude.
É apavorante, arrepiador.
Para conhecer o infinito, mostre o espelho ao espelho.
A solidão, a tristeza, a angústia assemelham-se ao final,
ao fundo, da reflexão dos espelhos.

Lugar de observação, ressalva,
percepção, argúcia, consternação.
Lugar de encontros e reencontros.
Nem sempre com o apetecido,
é oi de você para você mesmo.
Único quadro em movimento,
o exclusivo em arte real, com domínio público.
Ele te mostra o sorriso que você apresentou.
A língua, a careta, o tchau.
Ele aponta seus defeitos, em silêncio.
Em sigilo, suas qualidades.

É um túmulo, um confessionário.
Além de médico, estilista e psicólogo.
Tem olhar frígido, julgador (preciso).
Ao escuro parece um portal para outro mundo.
Me deu a louca, joguei todos fora.
Não quero me ver envelhecer.
Não quero ver meus defeitos.
Já sei de cada um deles, os conheço pessoalmente
e foi ele mesmo quem me mostrou.

Joguei a cama fora, estou dormindo no chão, num colchão.
Minha mãe disse que estou louca, possuída,
e que tudo que se faz a um espelho reflete de volta.
_Não estou louca, estou me livrando de um fuxiqueiro!

É mudo sim, mas fala meus defeitos pra mim,
que não sou muda, nem tenho língua presa.
Prefiro dormir no chão a uma cama com espelhos,
que fica mostrando meu cabelo ruim,
meu nariz grande, minha pele negra, meu pé quarenta.
Minhas espinhas!

Quebrei todos!
O do banheiro, da sala, próximo à mesa de jantar
e, principalmente, do meu quarto.
Quebrei todos...
e li hoje que quebrar espelhos traz sete anos de azar... Será?




Weslei Ribeiro. Ilustração: Mel Lisboa em ensaio para a revista Playboy, Editora Abril, 2004.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

FÁBULA SUICIDA























Janela, espelho meu,
responda-me:

_Se eu te saltar,
fodeu?

Do sapo que saiu do céu,
repito o esculacho:

_Afasta chão,
senão me esborracho!

Então, após o salto
suicida fatal,
virei pizza de asfalto,
sem orégano e sal.




Giovani Iemini - Mão Branca.

BLUESMAN


















Olhando o retrovisor,
o blusman vai divisando
o que ainda não passou.



Marcelo Farias - Para Entender a Mágica.

domingo, 13 de janeiro de 2008

DE MAIS NINGUÉM.























Ainda sou o ontem
que cortou a noite

e ao meu lado,
um Sol esfuziante,

com os dedos molhados,
tocava Rock in versos.



Ivone fs. Ilustração: Guitarrista (não consegui ler o nome do autor).

ESTALOS


















Verso meu escrito no chão.
Fruto pequeno da minha emoção.
Rastro menino do meu coração.

Palavras riscadas na terra,
nascidas da mente que encerra
a loucura plena e cega.

Mas ondas do tempo limparam
palavras e versos de mim...
Estou novo e raro,
pois os céus (do eu) clarearam assim.




Beto Reis.

sábado, 12 de janeiro de 2008

SOB UM VÉU DE ESTRELAS























No entardecer,
o Sol dança com a chuva
e um arco-íres
no horizonte tinge...
Espera a Lua surgir
e entre as nuvens,
uma estrela luzir.
Depois, a Terra sorri
quando na noite escura
o céu clareia...
Um véu de estrelas
abraça a lua cheia...
O poeta fecha os olhos
e sente o poema
correr em suas veias
A Lua deita no mar
e o Sol, novamente
beija a areia.




Sirley Passolongo.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

"A TARDE CAIRÁ CINZENTA"























Proferiu Goebbels ao ativar a fornalha.


Muryel. Ilustração: campo de concentração de Auschwitz.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

SAMBA DE SÓ























Se procura só beleza
faça-me a gentileza
dos teus olhos desviar.
Esta moldura é só pra agora,
daqui a pouco vai embora
e nada em mim vai te encantar.

Se procura só por bolso,
minha conta é um desgosto,
deixa eu logo te avisar,
meu dinheiro é pros meus sonhos,
na poupança eu não ponho,
tenho a vida pra arriscar.

Se procura só alegria,
Isso é mera utopia,
a tristeza há de chegar
e se ela for tão forte,
se até pensar na morte,
você vai me abandonar.

Mas se quer a minha vida,
meu delírio e fantasia,
pode se aproximar.
Se quiser entrar no samba,
eu aprendo sua ciranda
e me atrevo a te amar.

Mas se quer a minha vida,
sem supôr a despedida,
pode se aconchegar.
Vem com alegria de criança,
porque não vivo de lembrança,
sou capaz de te amar.




Bárbara Leite. Ilustração: Sambistas - J. Carlos.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

MÁFIA DAS MUSAS
















Musas enclausuradas bebem
estrelas pagãs.
Espancan-se,
compartilham o fel do sangue equivocado,
perdem o rumo em olhos bizarros
e ardem em terríveis desejos humanos.

Escravas da beleza luxuriosa,
pedintes do pecado da ternura,
canina e esterlizada,
fama da cama,
no manto da noite solitária.
Derramamento de fetos divinos,
amores lunáticos
nos seus rituais coagulados.
Anjos decaídos para todos os lados.

Roda de macumba,
preces desesperadas,
mulheres rasgadas nas entoadas fatais.
_Traga-me o som das sanguessugas!
Leve-me para longe destas rugas
de dentro da lama congelada.

Armas que atiram para dentro,
gritos que arrebantam o firmamento,
terrorismo de Vênus
que nos hipnotiza e acorrenta
no sonhar mais terrível:
Do platônico... Do absurdo... Do impossível.
(inflamável divino)




Rita Medusa. Ilustração: cena da peça As Bacantes, de Eurípedes.

ADOTE UM MALDITO
















Teu sorriso mordeu minha alma,
raiva prenunciada,
espuma vermelho-prateada,
cachorra louca a arder nas noites de verão!
Os visinhos me atiram coisas
quando subo no telhado
para uivar o amor maldito.
Ouço de harpa no teu grito
e ganidos de motores
na minha respiração.

Tudo em tom maior,
em uma valsa para as estrelas,
dose alta de delírio diário,
escárnio e confissões
(o que move
e dá sentido!),
pele, que escama virgem.

Saio de mãos dadas com Freud pela rua de terra.
Brincamos no barro
e ele explica que nem tudo
tem explicação.
Choro charutos dourados que me baforam.

Vazo poesia pelos poros,
a imundície lírica me entorpece
e me cala a boca cheia de formigas.
Túnicas e dedais.

A princesa se enforca na torre.
A solidão a levou à roda-gigante.
Preferiria me jogar,
o vôo é minha predileção.




Rita Medusa. Ilustração: cena de Maldito Coração, de Asia Argento, 2004.

INVERTIDA























Eis minhas unhas gastas
de ferir a terra e penetrar-lhe os segredos.
Quem passa verá meus pés sairem-lhe à flor.
Assim plantada muitos me dirão inversa.
Minha gana de louvor à terra lhes despreza o julgamento.
Meu ar são seus veios de ouro,
minha luz seus mistéiros de magma.
No reverso em que sonho,
piso o firmamento
e ergo a terra sobre mim mesma.




Devora-me ou te decifro . Ilustração: O Enforcado.

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

ANÁLISE























Na vida tudo me foi desmedido e lazarento.
Já fui Deus, e na mesma ocasião, fui criatura.
Fui de lúcido ao louco e do profano ao bento,
Fui na poesia o verso, mas depois a rasura.

Vivi decerto o céu, o nada e o holocáusto,
até ser eu estátua e igualmente iconoclasta.
Vi no meu reflexo a face de Arcos e Fausto,
Mas sem ver se era eu o alívio, ou vergasta.

Assim continuo sem saber meu veredicto,
Aonde termino e por onde o éter rasgou.
Não sei se era menos anjo ou mais maldito.

Sei que fui o nada e eu ao mesmo instante,
e me vendo outrora, hoje lembro que sou,
incognicível e lucidez, num corpo itinerante.



Ossip. Ilustração: quadro de Magritte.

CABANA AZUL


















*

Não me tome
em tua taça!

Antes,
me veja em pele crua,

pousa a língua
e ouça o tic, tac...

_Descompassa?...

Serei tua
e de mais... me serei,

*
*
* eu vi o céu...
*
*

nas horas de Helena
os vícios queimam
em cores plenas

serenas tremeluzem
as chamas curtas
das velas que enredam...
... o dourado fio
a que se netregam
à luz miúda

na cabana azul...




Ivone FS.

SE NÃO INVENTASSEM...





















Era uma vez...
Juro que viajei!
Eu era tudo o que diziam,
acreditei em fantasias.

Povoei minha imaginação.
Tem tanta gente,
imagens, lugares.

Juro que se
não tivessem inventado
tantas estórias de mundos
e gentes várias...

e não pudesse eu
me perder com tudo isso
em meus pensamentos...

não suportaria!!!...



Edson Feuser.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

CAMINHO PRIVADO


















Saia,
para percorrer seus labirintos
e volte!
Pra desestabilizar meu labirinto

e saia

e volte

e saia

e volte...




Bárbara Leite. Ilustração: L'alcova - Vottorio Gussoni.

INTERNOS DIÁRIOS





















O caldo quente que jorra
do vesgo dos meus olhos
neste lamento
tu não vês agora,
estão cá dentro.
Jorram ao contráio
molhando minhas entranhas
e internos diários.



Heloísa Galvez. Ilustração: a autora aos 15 anos de idade.

QUEM



















Entrei
máquina do tempo
templário loiro
vi nos braços meus
eu
cigana escura
vestido azul
corpos nus
adeus pela manhã
ciganinha ruiva
epreitando
nunca notei
guerreiro partiu
nunca voltou
morri
ciganinha chorou
e mais ninguém
afinal
você é quem?
Heloisa Galvez. Ilustração, Tropical , de Victor Manuel garcia Gitana.

domingo, 6 de janeiro de 2008

BÁLSAMO























Se me perguntarem
do cheiro da saudade,
vou dizer que hoje,
no final da tarde,

um cheiro forte
de dama inglesa
no fim da vida
me trouxe norte.

O resto, só sei supôr.

Falo com propriedade
do cheiro da saudade
que faz pulsar amor.


Bárbara Leite

sábado, 5 de janeiro de 2008

Carta a Lúcifer






















Minha vontade de te ter agora,
Sobrepõe minha necessidade de respirar,
Um desejo de não ser repreendida
Pelo que faça ou fale na vida,
Pelo comportamento do momento,
Pelo que visto, etc...e tal.
Te quero Lúcifer e tua lucidez,
Não quero-te e sim te quero,
Teus olhos pidões,tua insensatez...
Quero tua fome em meu corpo,
Tua nitidez de idéias e vontades,
Depravação, sadismo e submissão.
Um ser completo, objeto, intelecto,
Segurança e protetor...O meu amor!
Dizem que para tê-lo terei que morrer
Ou morar nas chamas do inferno,
Mas e o que disse o poeta:
Que o Inferno é aqui mesmo?
Quero teus braços, teus beijos
E os olhares de reprovação,
Como um voyer em contemplação.
E gozar, e gozar, e gozar, plena
De ter te tido, te amado, possuido,
Do jeito que o Diabo gosta!!!

Preciso urgênte de resposta!!!!

A VIDA























Há dias em que ela é tão linda quanto o amanhecer.
E, em outros, nem sempre é o que pode parecer.
É, também, como um ocaso, aparente...
A vida é pura magia, fato decorrente!

Fantasias que fazemos e nem sempre realizamos.
Desejos que aspiramos e nem sempre conquistamos.

Caminhos que nem sempre são floridos.
E quase sempre (do homem) são perdidos.

Vitoriosos dias de batalha, que lutamos.
E, longos dias de derrotas que ultrapassamos.

Momentos mágicos, como nascimento.
Momentos fúnebres... Lamento!!!

A sensibilidade para sonhar com o que almejamos...
Assim como o renascimentos que procuramos.

É o desejo que temos que crescer...
e novamente, como Fênix, renascer.



Fernanda Reis.

INCA























Conheço essas feições de inca,
esse perfil andino em cobre cinzelado!
Não preciso sequer fechar os olhos
para redesenhar em pensamento
os ângulos abruptos,
os súbtos penhascos,
paisagens desse rosto inusitado.
Qualquer coisa me toca fugazmente
o âmago do cérebro.
A idéia que não sei apreender,
no escuro de todas as idéias,
como chama de vela
trêmula e dança.

Uma dor, um ardor, uma lembrança?
Traços sombrios de sulamericano,
os cílios longos como de criança.



Betty Vidigal. Ilustração: índio quechua.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

BACCANALE


















A masmorra em um beijo.
Encantamentos gelados
que acasulam!!!
_Um brinde às nossas máscaras!

.........................................................

Fantasia moribunda?!...
Adeus! Vamos raiar ou transbordar
em móbiles de dores
e de cores da melancolia...
_Uuuuuuuuuuuuuu!!!...
parada para roubar almas!...



Rita Medusa. Ilustração: cena de De Olhos Bem Fechados - Stanley Kubrick, 1999.