segunda-feira, 26 de julho de 2010

A NOITE EM QUE ELE QUIS VOLTAR PARA CASA























Era véspera de ano novo. Não faz muito tempo... O combinado era que nos encontraríamos no centro da cidade. Ele, eu e mais um outro amigo nosso. Passaríamos a virada do ano na casa de um amigo de infância, música e bebedeira deles. Eu não conhecia o sujeito. Seríamos apresentados naquela noite. Eu fui a primeira a chegar no local combinado. Louca para fumar um cigarro. Eu estava há mais ou menos uma semana sem fumar, em mais uma das minhas tentativas frustradas em largar a Nicotina. Não fumei. Afinal, logo ele chegaria e quando me beijasse, saberia que havia fumado e brigaria comigo. E eu não queria brigar, afinal era véspera de ano-novo e um simples bombom de menta não disfarça bafo de cigarro... Sentei no banco da parada de ônibus enquanto esperava que um dos dois aparecesse. E fiquei a observar uma metrópole em época de fim de ano. Pessoas indo, pessoas voltando. Pessoas gastando com muitas sacolas nas mãos. Algumas comprando o presente de última hora praquele amigo oculto que rola na confraternização do trabalho... Até que nosso amigo chega já dizendo que está com fome. Eu sorrio. E vamos atrás de alguma coisa que ele possa matar a fome. Mais a frente havia um churrasquinho de gato. Daqueles mesmo que têm em cada esquina da cidade. Eu aproveito pra filar um copo d'agua. Eu não tinha fome, e sim sede. Voltamos para a parada de ônibus que era o local combinado. Meu amigo acende um cigarro.

-Ah, eu queria fumar. -Digo.

Ele responde:

- Sai daí, tu não pode!

Nós sorrimos um pro outro. Ele estava atrasado. Isso era ruim. E ele nunca se atrasava. Odiava se atrasar porque odiava fazer alguém esperar e odiava mais ainda quando alguém o fazia esperar. Eu gostava disso nele. Sabia que ele não se atrasaria, quando marcávamos um encontro. Já eu, o deixava esperando volta e meia. Não de propósito. Mas é que eu nunca tive muita noção do tempo mesmo... Já eram quase seis e tínhamos combinado às cinco. Eu achei muito cedo, mas concordei. Eu não tinha muito o que conversar com o nosso amigo. Só queria que ele chegasse logo para que pudéssemos seguir o nosso rumo. Levanto a cabeça e entre aquele monte de gente com sacolas nas mãos, eu o vejo. Ele vem andando apressado. De certo chateado porque se atrasou.

- O ônibus demorou! -Disse ele.

E me beija. Os dois amigos se cumprimentam e então podemos seguir rumo à casa do sujeito. Ele segura minha mão e já me puxa dizendo que podíamos pegar aquele ônibus. Eu nem vi o número. O importante é que nos levava pra onde queríamos ir. Eu vou calada durante a ida. Enquanto os dois amigos conversam aos montes. Ele sentado ao meu lado minha mão sobre sua perna e o nosso amigo sentado a nossa frente, porém com o corpo virado para trás. Já estava escurecendo. Pela janela eu olhava a rua, as pessoas e as luzes. Eu nunca fui muito fã de Natal, mas adoro as luzes.

- O centro está lindo, iluminado! -Falo baixinho.

Mas nenhum dos dois me ouve. Por um lado é bom saber que mais um ano se passa. Depois então você se toca que está envelhecendo. Mas eu não me importava com isso naquele momento. Eu estava feliz. A casa do sujeito não era muito longe do centro, logo estávamos lá. Havia gente conhecida. Quer dizer, era um casal de conhecidos. "Menos mau!" - pensei. Ela estava grávida, acho que devia estar com uns sete meses. Nem perguntei... Sou apresentada ao dono da casa:

-Essa aqui é a minha namorada.

-Prazer!

Ele também apresenta a sua.

-Prazer!

Eu a achei muito bonita. Com cabelos muito pretos, brilhantes e compridos... No meio da sala há uma mesa improvisada de dominó. As duplas vão se formando, eu jogo com um cara lá que também conheci na hora. Ele até que não jogava mal... Acho que ganhamos umas duas partidas seguidas. Tem vodka na mesa e toca alguma coisa que me soa totalmente desconhecida. Mas o dono da casa conhece. Claro! Todos bebem. Menos eu. Não queria beber aquela noite... Na cozinha o pessoal prepara a comida. As mulheres estão na mesa tomando cerveja e jogando baralho. Na sala estavam os homens, a vodka e o dominó. Eu não sei o porquê, mas sempre gostei mesmo é de ficar no meio dos homens. Ouvir e rir das piadas. Rir de como eles competem tanto. De como se xingam. Fui na cozinha só pra tirar umas fotografias da mulherada. Ainda as tenho em casa.

-Ai! Saí barriguda! Tira outra! - Diz a bonita namorada do dono da casa enquanto mostro as fotos pra elas.

Nós rimos e eu tiro outra. Desta vez ela encolhe a barriga. Eu volto pra sala. Há muito papo, todos se conheciam há muito tempo, e tinham muitas boas histórias pra contar... Ele está bebendo com rapidez a vodka. Logo vai ficar bêbado. Eu pensei. Ele ficava muito chato bêbado. Petulante. Enchia o saco mesmo! Enchia mais ainda quando o alvo das provocações dele começava a se sentir incomodado. Comigo não. Ele se mostrava muito, senão até mais carinhoso. Falava calmo, me contava segredos, nós ríamos de estórias que inventávamos... Eu acho que ele me amou mesmo.

-Meu bem, vamos dormir aqui esta noite?

Ele pergunta.

-O quê? Eu nem desejei feliz Ano Novo pra mamãe! -Exclamei.

-Liga pra ela e deseja. -Ele respondeu.

-Porra, você devia ter me avisado antes!

-Eu achei que você sabia que íamos dormir aqui. -Ele diz já com os olhos de vodka.

-Vou lá fora ligar, digo já saindo da casa em direção ao quintal.

-Tá bem, ele me responde.

Eu saio na frente e ele me segue. Fazer ligação em véspera de Ano Novo é uma merda! Depois de umas cinco tentativas consigo falar com a minha mãe:

-Vou dormir por aqui mãe. Feliz Ano Novo! Te amo!
Ele pede pra mandar um abraço e que também deseja um Feliz Ano Novo pra ela. Minha mãe deseja o mesmo. Eram oito da noite. Desligo o telefone. Ele me beija e coloca a mão entre as minhas pernas. Ele olha pra trás, querendo saber se alguém viu, mas todos estão jogando, bebendo e conversando. Nós sorrimos.

-Vamos!

Ele me puxa pela mão e voltamos para junto dos outros. Todos continuam se embebedando eu sentada no sofá pensando em como queria fumar um cigarro...

-Ah foda-se vou fumar!

-Não! -Ele me reprova.

-Me empresta teu isqueiro?

-Claro que não!

Então levanto e vou atrás de outro e pego o da namorada bonita.Volto ao quintal e fumo meio cigarro. Já me basta.

-A comida está pronta, quem quiser pode se servir na cozinha! -Diz o dono da casa.

A irmã dele foi quem cozinhou tudo. E estava tudo ótimo. Ele não quis comer, dizia que quando bebia não comia. Tudo bem, eu já com o garfo em punho. Ouço um barulho na sala. Alguém derrubou um prato. Eu estou feliz e sorrio de tudo aquilo, de estar ali de ver todos bêbados e se divertindo, falando merda, de ser véspera de Ano Novo, pensei na minha mãe, no meu irmão, em uma amiga... Depois de muita vodka ele vem e me diz:

-Vamos pra casa?

-O quê? Agora?

-É, vamos dormir na nossa cama.

-Porra você é mesmo foda! -Eu digo exaltada.

A verdade é que eu não conseguia me negar a ele.

-Então vamos logo, pra dar tempo de chegar antes da meia noite em casa!

Nos despedimos. O amigo que veio com a gente ficou por lá. Saímos em direção à parada de ônibus que demora... A casa do sujeito era longe da minha. E em véspera de Ano Novo os ônibus param às onze horas. Motorista e cobrador também têm família né...

-Acho que não vamos mais conseguir pegar ônibus pra voltar. Já são quase onze horas. -Eu digo.

-Vamos esperar, qualquer coisa voltamos.

Pegamos o ônibus e partimos rumo à minha casa. Fomos calados. Apenas segurando a mão um do outro. Eram onze e trina quando chegamos em casa. Para nossa surpresa, minha mãe havia saído e tivemos que pular o muro.

-E agora como vamos entrar?

-Vou tirar o pino da porta.

Eu o ajudo pegando o martelo dentro da caixa de ferramentas que fica embaixo da pia, na lavanderia e ele começa a retirar os pinos. O barulho do martelo batendo é muito alto, mas parece que ninguém ouve.

-Se fosse ladrão, a casa já ía ser roubada, eu falo.

Ele me olha e sorri.

-Olha como estamos passando o Ano Novo. -Ele diz sorrindo.

Eu sorrio também. Eu olho pro céu. E começo ver os fogos de artifícilo anunciando a meia noite! Já é outro ano. Ele deixa o martelo no chão, se levanta, me abraça e diz:

-Feliz Ano Novo!

-Feliz Ano novo!

Nos beijamos. Ele volta e tira o último pino que faltava e enfim penetramos casa adentro.

-Vou deitar meu bem. Te amo!

Me beija e vai pro quarto. Eu ligo a TV. Passava Chicago. Eu me deito no sofá e assisto um bocado. Eu fumo um outro cigarro escondida enquanto olho pela janela e derramo algumas lágrimas baixinho. E vou ao quarto vê-lo dormir. Eu estava muito feliz...


Raissa Aimê

Um comentário:

MARCELO FARIAS disse...

Raissita, você surpreendeu!