quinta-feira, 6 de setembro de 2012

TRIP



Vermelho entre o azul e o rosa.
Luzes vão do Paraíso.
Só o mistério persiste,
escondido que está
em minha nova cena.

Não entendo nada 
neste momento.
Do Letes bebi 
e tudo me vem 
em sonhos.
Anotações não serão anotadas.

Você pode explicar um carinho de mãe?
A terra me convida a esquecer
e dormir até um novo dia.

Amanhã será bem melhor.


Marcelo Farias.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

INDIE

Os Young Folks, animação do clip de Peter, Bjorn and John (2006).


Eu nasci em um playground
em um parque de diversões
e não posso deixar de brincar.

Eu não sou o filho preferido,
não sou o centro das atenções,
eu apenas sei brincar.

Eu cresci e não deixei
de ser criança ainda
aos meus trinta e tantos anos...

Eu sou indie!

Eu sou indie, alternativo.
O universo paralelo
foi quem sempre me esperou.

Vou conversar com heróis
de revistas em quadrinhos.
Advinhar brinquedos, animes
que mamãe não quer que eu leia.

Eu sou indie!
Alternativo!
O universo paralalelo
foi o que sempre me esperou.

Quando eu morrer, finalmente,
digam que apenas fugi
para o universo do sonho
aonde sempre vivi.

Eu sou indie, alternativo.
O universo paralelo
foi o que sempre me guardou.


Marcelo Farias.

sábado, 11 de agosto de 2012

TRANSILVÂNIA



A pequena Anna angustiou-se quando não viu ninguém mais à sua volta no quarto. Pulou da cama, apenas de camisola, apesar do frio e desceu. Seus cinco irmãos brigavam sobre a mesa enquanto Nora, a irmã mais velha, servia a sopa e ralhava ao mesmo tempo. Sentou-se em seu lugar e reclamou:
_Por que não me acordaram?!
Nora esbravejou:
_Quem é preguiçoso fica sem comer!
_Eu não sou preguiçosa! _rebateu Anna, malcriada.
Lá fora a neve cobria tudo de branco. Os homens andavam para lá e para cá, entretidos no trabalho, como se estivessem reformando a vila. Anna pulou da mesa e correu dizendo:
_Vou ver papai!
A mão firme da mãe, Eszter, a conteve.
_Nada disso! Você vai comer primeiro e se vestir. Se adoecer, quem vai perder noites de sono sou eu!
Mesmo irritada e chorosa, Anna volta à mesa. A mãe enche seu prato de sopa de carne. Pedaços de batata flutuam sobre o caldo avermelhado de paprika. A mãe lhe dá um grande pedaço de pão e ralha:
_Agora coma! E não saia daí sem ter limpado o prato!
A irritação de Anna passa aos poucos, a cada colherada no caldo pimentoso. Quando acaba, está rosada pelo calor do desjejum. Vendo que a pequena já terminou, Eszter a pega pela mão, lhe dá um breve asseio, e depois a veste. Em seguida, a mãe lhe entrega um pedaço de pão com carne de porco, envolto em uma toalha e diz:
_Dê a seu pai. Diga para não se esquecer de vir almoçar e não se embriagar com a pálinka.
Anna corre para frente da casa, onde está o pai, pintando uma grande cruz na porta, com sangue de carneiro. Ao ver a filha, Ferenc pára o trabalho a toma nos braços e levanta, festejando:
_Bom dia, pequena princesa! 
Anna ri com o gracejo, os beijos e as cócegas que o pai lhe faz, mordendo-lhe de leve. Ele então a põe no chão e termina o serviço pendurando um grande colar de alho na porta. Pega então seu lanche. Anna dá o recado da mãe:
 _Mamãe disse para você não se embebedar.
Ele ri e responde:
_Com este frio, vai levar vinte anos até seu pai possa se embebedar!
Ferenc senta-se então no pequeno banco de três pernas e come. Anna senta em seu colo e ele lhe dá um pouco de pão com porco. Quando termina, ele a pega pela mão e diz:
_Agora vamos passear um pouco.
As ruas da vila estão movimentadas. Homens andam para lá e para cá, carregando ripas de madeira, fachos de lenha, colares de alho e baldes com sangue de carneiro. Mulheres carregam baldes de água e pedaços de carneiro encobertos em panos. Ferenc cumprimenta os amigos enquanto passeia com a filha. Ao passar pelo sacristão, Ciprian, este lhe lembra:
_Não esqueça de ir à missa das seis, Ferenc, já está rosado de pálinka!
_Não me esquecerei, irmão Ciprian! Não me esquecerei! Mesmo que beba toda minha garrafa!
Em certo memento, Anna pede:
_Papai, vamos ficar aqui vendo o pôr do sol atrás das montanhas!
_Tudo bem, Anna! Mas não vamos nos demorar muito, logo teremos de voltar e ir para a missa.
Durante mágicos quarenta minutos, Anna vislumbra o sol se esconder dela _como se sorrisse marotamente _detrás das montanhas cobertas de pinheiros e neve. Quando a escuridão começa a cair, o pai a apressa:
_Vamos, Anna! Hora de ir à missa!
Sabendo ter perdido tempo, Ferenc prefere ir direto à igreja. Lá encontrou a esposa já com os outros filhos. Esta reclamou:
_Devia ter pelo menos passado em casa, para se assear para a missa!
_Cristo nunca rejeitou ninguém por sua aparência, lembra?
Ferenc então assiste à missa ao lado da filha, que nota que não apenas seu pai, mas  muitos homens sairam direto do trabalho para a igreja. Na hora da comunhão, Anna suplica:
_Papai, diz pro padre me dar a hóstia para comer também!
_Não, Anna, você só poderá fazer isso depois de sua primeira comunhão.
Acabada a missa, todos rumam para suas casas. A escuridão já cai sobre a vila. Apesar de se mostrarem apressados, os aldeãos conversam alegremente na rua, a caminho de casa. Ferenc conversa com o amigo, Tamás. Suas esposas conversam entre si e os filhos de ambos fazem algazarra atrás. Ao lado dopai, Anna ouve sua conversa:
_Será que Péter aparecerá entre eles? _pergunta Ferenc.
_Não sei, ninguém o viu desde que desapareceu, nem mesmo o velho Lajos, que mora na floresta. _responde Tamás.
Avistam então, deitado, meio escorado em uma das traves que apoia o teto da taverna, o bêbado Vilmos, entornando mais um longo gole de pálinka goela abaixo. Tamás brinca:
_Eles nunca fazem nada com ele, acho que não gostam de seu bafo!
_Ou do seu cheiro! _brinca também Ferenc.
Os dois por fim se despedem e se separam. Chegando em casa, Eszter ordena ao marido:
_Tire esta roupa imunda, que já esquentarei água para seu banho!
Enquanto o pai se banha, Anna e Friderika arrumam a mesa do jantar, enquanto Nora esquenta a sopa e o carneiro. Os três irmãos homens cuidam de fechar a estrebaria, para que o cavalo do pai e única vaca que possuem estajam bem agasalhados e seguros.
Por fim, a família senta à mesa e Ferenc faz a oração antes da refeição:
_Senhor, te agradecemos pelo alimento e a morada que temos e pela divina graça de tua proteção. Amém!
Todos então começam a comer alegremente. O ambiênte é calmo e feliz, bem diferente da animosidade do início do dia. Após a janta, as meninas ajudam a mãe com a louça e os meninos vão ouvir o pai contar suas estórias. Todos, por fim, se juntam em turno de Ferenc para ouvir suas pequenas aventuras de aldeão, até que Eszter decreta:
_Muito bem! Já ouvimos estórias demais, é hora ir deitar!
Apesar da queixa dos filhos, inclusive Anna, todos sobem. No quarto, no sótão, Nora ainda tem de ralhar com os irmãos menores, para que eles se aquietem e durmam. Por fim, o sono recai sobre todos, mas muito leve sobre Anna, que desperta com o soar do sino da meia noite. Como dormisse próxima à janela, entreabre a cortina e olha a rua. Com passos incertos, por vezes cambaleantes, olhando para o céu, como se adorassem a lua, chegam os vampiros. Homens e mulheres com as roupas rotas, por andarem como bichos pela floresta e pelos cemitérios. Seus rostos são muito pálidos e seus olhos apresentam olheiras arroxeadas. Dois deles, ainda jovens, se aproximam do bêbado Vilmos, que dorme a sono solto. Logo em seguida, dele se afastam, fungando como se tivessem sentido cheiro de peste. Vilmos ainda desperta brevemente e profere pequena queixa. Anna solta um leve riso. E os vampiros continuam seu cortejo pela vila, olhando para o céu, como que alucinados!...


Marcelo Farias. Ilustração: Brasov no inverno.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

PARTO



 A minha insônia é a mesma tua.
É a filha que está por vir,
o marido que não vem,
a esposa que resolveu virar puta.

A minha vida é a tua própria
reticência...
Não sou Deus, nem ateu.
Apenas a punheta que se personificou
em ato!...
Ou pacto carnal...

O meu e o teu sorriso é um escárnio
e fechamos a bíblia de nossa
ignorância!...

Rojefferson Moraes

sexta-feira, 30 de março de 2012

BLANCA














Hoje me reservo calar diante destes versos
Ir e sem olhar para trás partir em busca de uma musa qualquer
Me ensopar nas línguas molhadas das ruas
... Num ritual de iniciação para a noite
Voz, cheiro e tempestade temperando a boca da rua que me engole sedenta

Não tenho versos hoje para te oferecer poesia!
Não tenho minha voz alterada
Só este corpo baixa cambaleante mirando
As casinhas enfileiradas que se confundem
Enquanto o que me sobrou do dia ainda me consome...

Um brilho breve e bravo incalculados nos teus olhos
Embriagues desatinada no riso
Entrando em convulsão depois do tédio...
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Rojefferson Moraes.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Um Breve Monólogo de Um Bêbado Saudosista

Batem os sinos da nostalgia. Abrem-se os portões lúgubres da saudade. Morrer, viver, seguir a torpes e tortuosos passos num rumo desesperado e inquieto. Caminham com o peso dos corpos ressequidos, ouço os passos no corredor. Vendendo almas vazias a preço barato? O silêncio já não é a paga que busco para a exasperação do infinito que vejo cair como vidraça estilhaçada diante dos meus olhos cansados e arenosos de uma noite mal dormida de bebidas, sexo, risos e lágrimas, onde já não há espaço para poemas e canções antigas. Promessas são esperadas - ofereço o meu corpo -, desmonto todo o ciclo de orações. Sangro. Busco o equilíbrio químico do meu estômago. Veneno na taça? Vinho na veia se dilui com o cansaço do dia. Batidas cansadas do coração. Tão novo ainda... Tão velho amigo do sofrimento. Exílio é resposta? Putaria é solução... Religião, talvez, não! Quantos amigos se voltam contra a pátria? E os sinos insistem na saliência híbrida com as ensurdecedoras buzinas e caos que massacram da poesia a um cálculo matemático. Ah, a nostalgia... Uma bela mulher mostra rugas ao sorrir e continua ainda mais bela. O vinho está acabando. Mas no supermercado vende-se mais sonhos e desilusões engarrafados de todos os sabores, marcas e tamanhos. Respirar é preciso, navegar é perigoso quando se aproxima a tempestade. Sangro. Busco o equilíbrio do corpo. Venta. Os sinos se calam quando me calo embriagado no meu quarto escuro e vazio. A noite se cala. E os portões da saudade se fecham para sonhos indecifráveis.  

Os bêbados ou Festejando o S. Martinho Quadro de José Malhoa
Museu José Malhoa - Caldas da Rainha
http://www.romulonarducci.blogspot.com/
 

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

O FARMACÊUTICO


















Cresci numa farmácia, meu pai era farmacêutico. Eu "viajava" nas imensas estantes e prateleiras repletas de frascos com drágeas, pílulas, xaropes e cosméticos. Eu adorava cheiro de remédio. Nunca reclamei quando tinha de tomar pílulas. Ao contrário, adorava engoli-las. Aquelas coisinhas sempre tão "científicas e futuristas". Já os xaropes me pareciam mais tradicionais, século XIX. Costumava levar xarope Vick para tomar na escola, e adorava me embriagar com Biotônico Fontoura. Papai brigou várias vezes comigo, ao me encontrar recostado na parede, "entorpecido" pelo biotônico. Era o meu Láudano.
Sempre ajudei papai de bom grado na drogaria. Era capaz de passar o dia inteiro nela, fecha-la com ele, se fosse preciso. Fiz isso muitas e muitas vezes, abri e fechei a drogaria. Era mágico ver a lagarta subir. Triste, mas romântico, vê-la baixar.
Perdi minha mãe aos 9 anos, câncer. Sempre fui filho único e papai precisava muito de mim. Não me queixava, nunca me queixei. Aos 12 anos tive minha primeira "viagem": tomei duas pílulas de gardenal. Foi louco! Papai brigou comigo. Experimentei outros remédios. Alguns me deram dor de barriga, outros me fizeram vomitar, outros me acalmaram, outros mais... novamente me fizeram viajar.
Quando conheci minha primeira namorada, Pamela, a levei para meu mundo mágico: a farmácia. Por algum motivo ela gostou e namoramos cinco anos. Papai pensava que nos casaríamos, morreu pensando isso. Um avc o levou de repente, numa tarde, quando ela contava 56 anos. Estava colocando os remédios na prateleira. Quando ele caiu para trás, pensei que fosse um tolo acidente. Porém, quando cheguei no hospital com ele, o médico o mandou para a UTI. Pamela ficou comigo durante o enterro e depois dele. Não houve velório, não tinha dinheiro nem parentes próximos para isso. Meu namoro com Pamela acabou seis meses depois. Como papai, ela não gostava de minhas brincadeiras com remédios. Ela foi a única mulher decente com quem me relacionei. As que apareceram depois foram todas doidas de festa, nada mais.
Vendi a drogaria e trabalhei como estagiário em outra, enquanto terminava a universidade. Mas que nunca, eu experimentava remédios. Para aliviar a depressão pela perda de papai, tomava remédios de tarja preta. Para elevar o astral, tomava anfetaminas. Foi quando um colega de sala me apresentou o LSD. Foi como dar a varinha ao aprendiz de feiticeiro. Mas que nunca conheci _e reconheci! _minha alma!...
Depois do LSD, conheci a cocaína, a morfina e a heroína. Cocaína só usava quando bebia e em pouca quantidade. Morfina começou a se tornar um costume e heroína era difícil, mas apreciava muito seu efeito. Uma vez formado, aluguei uma casa onde montei um laboratório particular. Passei a sintetizar as drogas que conhecia. Não mais comprava drogas na rua, usava apenas as que eu mesmo produzia. Com o tempo, passei a vender para os amigos. Estes trouxeram mais amigos. O dinheiro começou a aparecer.
Comprei uma casa nova, espaçosa, com piscina, ótima para festas. Adaptei meu laboratório lá e dei festas onde lucrava horrores. Em meu jardim também fiz experiências. Fui um dos primeiros a produzir a cannabis hidropônica. Mal o extase se tornara mania na Europa, eu já o havia conseguido numa viagem à Holanda. Aprendi a sintetizá-lo e fui um dos primeiros a produzí-lo e vendê-lo por aqui. Minha vida era uma rave. Patrocinei bandas techno, contratei um dj, Jonas, para trabalhar em minhas festas. Quando não dava festas em casa, levava meus produtos para festas de amigos. Meu esquema era fechado, privado, por isso conheci muita gente famosa.
Minha vida foi uma viagem até 2003, ano em que passei de todos os limites e tive uma overdose. Havia aberto o dia com barbitúricos, me empolgado e tomado ácido, me empolguei mais ainda e cheirei cocaína. Tudo isso regado à álcool. Por fim, tomei uma dose de morfina e algumas horas depois, uma de heroína. Queria dormir e fui parar na UTI. Os médicos não sabem como escapei. Talvez tenha sido Pamela e sua aura de anjo. A reencontrei depois de muito tempo. Não sei porque ela resolveu aparecer naquela festa. Ficou até o final... e me levou para o hospital.
Comecei então minha recuperação. Vendi minha casa e o laboratório. Me acostumei a levar uma vida careta. Não sei se me casarei com Pamela, apesar de me dar bem com a filha dela, Astrid. Só o que preocupa minha mente agora... é que fui apresentado a um novo laboratório, de mágicas paredes de azulejo azul!... Imensas prateleiras repletas de frascos! A luz fluorecente chamando como neon. A empresa em que trabalho quer que eu produza drogas lá. Estou em 2010, tenho 56 anos... Um dia desses sonhei com papai.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

POEMA DAS COISAS DESENCONTRADAS