Flávio Mello é qualquer coisa entre Capinan e Torquato Neto. Se é que é possível conciliar estas duas personalidades em alguém... De fato, Capinan faz com que Flávio não se mate. Se Flávio fosse apenas Torquato, não nasceria, seria abortado!... A escrita de Flávio Mello é um vômito do codiano. Ela flui com a própria imprevisibilidade do imediato. Esta forma de narrar está bem em cotexto com os dias de hoje. Se observarmos a sequência de imagens de um filme brasileiro atual, veremos que é assim: cortes abruptos, tudo é mostrado em sequências fragmentadas... porém lógicas! É a lógica interior.
A literatura, bem antes do cinema, adotou essa forma de narrar faz tempo. Na época de Proust, isso era chamado de "tempo psicólogico". Flávio, no entanto, não expressa apenas tempo, mas uma forma de ser e sentir. Um sentir que está em sintonia com os dias de hoje, com 1 milhão de outros Flávios e Flávias existentes por ai e até dentro de nós. É como se você interpretasse alguma peça do Asdrubal apenas para si mesmo, tendo você como único ator... e não querendo ser engraçado. Se você é um palhaço, não o é por opção, mas por maldição!... A maldição de todo ser moderno: viver sobre a corda banba do picadeiro abaixo dos edifícios... com os carros correndo como crocodilos no rio grafite de asfalto, onde será arrastada a pasta do teu corpo quando ele cair... para o delírio e aplauso da platéia!...
Talvez seja uma forma mais dramática, mais "trash metal" , ou "mangue beat" de Luís Fernando Veríssimo. O fato é que Flávio Mello nos reporta ao imediato, ao agora, como se você estivesse vendo a cena se movimentar de dentro dele: o narrador. O narrador "é" você! Pois você vive o cotidiano que ele vive. Ache você medíocre, ou não. Sei que é chato se sentir um palhaço de vidro: ridículo, engraçado e que se quebrará daqui pra ali... (e isso é que fará todo mundo rir!). Mas isto é o cotidiano. Uma peça em palco pobre, onde entramos desde o dia em que nascemos. E que talvez, quando morrermos... percebamos que foi apenas um sonho. Um sonho tolo que julgamos ser real.
Marcelo Farias. Ilustração: Palhaço, de Michel Mendes.
3 comentários:
bom... o que dizer FODA... usarei esse texto pra tentar mostrar as ideias que tenho sobre o ato de escrever e de mundo... vc revelou em parágrafos uma vida literária... foda mesmo... valeu, luz e paz!
F.Mello
Boa resenha Marcelo! lí um livro desse cara de uma "sentada só" na casa do nobre Marcos ney e a escrita dele é du caralho... poesia na medida certa e desfechos de bom gosto.
abraços...
Gostei muito, Marcelo. Sugiro que publicamos na Gastrite III. O QUE TE PARECE?
Abraços!!!
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