quinta-feira, 1 de março de 2012

Um Breve Monólogo de Um Bêbado Saudosista

Batem os sinos da nostalgia. Abrem-se os portões lúgubres da saudade. Morrer, viver, seguir a torpes e tortuosos passos num rumo desesperado e inquieto. Caminham com o peso dos corpos ressequidos, ouço os passos no corredor. Vendendo almas vazias a preço barato? O silêncio já não é a paga que busco para a exasperação do infinito que vejo cair como vidraça estilhaçada diante dos meus olhos cansados e arenosos de uma noite mal dormida de bebidas, sexo, risos e lágrimas, onde já não há espaço para poemas e canções antigas. Promessas são esperadas - ofereço o meu corpo -, desmonto todo o ciclo de orações. Sangro. Busco o equilíbrio químico do meu estômago. Veneno na taça? Vinho na veia se dilui com o cansaço do dia. Batidas cansadas do coração. Tão novo ainda... Tão velho amigo do sofrimento. Exílio é resposta? Putaria é solução... Religião, talvez, não! Quantos amigos se voltam contra a pátria? E os sinos insistem na saliência híbrida com as ensurdecedoras buzinas e caos que massacram da poesia a um cálculo matemático. Ah, a nostalgia... Uma bela mulher mostra rugas ao sorrir e continua ainda mais bela. O vinho está acabando. Mas no supermercado vende-se mais sonhos e desilusões engarrafados de todos os sabores, marcas e tamanhos. Respirar é preciso, navegar é perigoso quando se aproxima a tempestade. Sangro. Busco o equilíbrio do corpo. Venta. Os sinos se calam quando me calo embriagado no meu quarto escuro e vazio. A noite se cala. E os portões da saudade se fecham para sonhos indecifráveis.  

Os bêbados ou Festejando o S. Martinho Quadro de José Malhoa
Museu José Malhoa - Caldas da Rainha
http://www.romulonarducci.blogspot.com/
 

Um comentário:

MARCELO FARIAS disse...

Desabafo, poema, crônica poética? Ou simplesmente um delírio? Talvez só o último traduza este estado de espírito (e organismo).