domingo, 25 de novembro de 2007

AS CRIANÇAS DO CEMITÉRIO (Children of the Grave)


Em 19 de novembro de 1647, durante a Revolução Inglesa, um pelotão montado de ironsides chacinou um grupo de quarenta crianças, que atiravam pedras durante sua passagem em uma estrada próxima à vilda de Windsor. O povo da vila, revoltado, armou uma emboscada para os soldados, no caminho para Londres. Armada com paus, pedras, facas, foices ou apenas as próprias mãos, unhas e dentes a turba trucidou inacreditavelmente o pelotão, a despeito das muitas baixas entre os aldeões. Ao fim da batalha, os corpos dos soldados foram queimados em uma imensa fogueira. Na manhã seguinte, as crianças receberam um funeral honroso no próprio local onde foram assassinadas, como se fossem guerreiras que merecessem ser enterradas no campo de batalha. A partir deste dia, os aldeões passaram a utilizar o local como novo cemitério, pois tornou-se uma honra ser enterrado ao lado dos "heróis pequeninos". Porém, tal honra aumentou sobremaneira depois que os cabeças redondas tomaram o poder e decapitaram o rei Carlos I, em 1649. Como represália pela morte do pelotão, Cromwell, ordenou à condenação à forca de todos os aldeões que participaram do combate.
Culpados e inocentes, contando um total de duzentos e quarenta aldeões foram enforcados ou mortos a esmo pelos soldados, que chegarram a arrastar os corpos de vinte deles presos a seus cavalos. Líderes da aldeia tiveram suas cabeças cortadas e expostas ao povo. Em longo trecho da estrada que ia de Windsor à Londres, os viajantes ficavam horrorizados com a fila de corpos dependurados pelo pescoço, sendo devorados pelos corvos, cobertos de moscas e exalando o pútrido cheiro da morte.
Mas de cento e quarenta anos se passaram e, em 1791, um viajante ilustre, Sir Callingan, que passava a cavalo pela estrada, pouco antes de alcançar o cemitério, declarou ter visto crianças correndo, rindo e escondendo-se entre as árvores. Era por volta da 01:00 hora da madrugada e Sir Callingan disse ter chegado a gritar para as crianças:

"_Vão para casa! Isso não são horas de crianças brincarem de esconder!"

Mal acabou de falar, foi surpreendido pelo abrupto silêncio e desaparecimento dos pequeninos. Seu espanto, no entanto, ainda não foi muito até este instante. Ao passar pelo cemitério, observou que muitas cruzes tinham datações muito curtas para a vida de um adulto. Concluiu então, instintivamente, que vira as crianças enterradas ali. Homem racional, no dia seguinte, em uma hospedaria próxima à Londres, comentou o incidente com o hospedeiro e os demais presentes. Mal começaram a ouvir a narrativa, seus rostos empalideceram e começaram a benzer-se.
Contaram-lhe então o antigo incidente da revolução e convenceram-no a certificar-se da história nos anais de Londres. Nobre, detentor de privilégios, Sir Callingan recebeu autorizaçãopara investigar os documentos antigos da cidade e não tardou a descobrir uma carta militar, datada do ano do Senhor de 1649, que narrava o incidente com as crianças e apresentava a ordem de Cromwell de retaliação à vila de Windsor. Pasmo, Callingan mandou rezar uma missa às almas das crianças em Westminster e nunca mais passou, nem de carruagem, pela estrada que liga Windsor à Londres, tal como narrou em seu diário.
Este, no entanto, foi apenas o primeiro relato famoso àcerca das "crianças do cemitério". Muitos outros iriam juntar-se a ele no decorrer dos cinquenta anos seguintes. Em 1848, uma enxurrada de relatos sobre as crianças do cemitério de Windsor encheram os jornais de Londres. Entre eles, o de uma senhora de cerca de cinquenta anos, Josephine Hammilton, professora primária que viajava de carro de Reading para Londres. Miss Hammilton afirmou que ao passar pelo cemitério, pouco antes de alcançar Windsor, apavorou-se após ter um repentino e macabro encontro com um menino:
"_Era um menino de cerca de onze anos, de cabelos longos e castanhos. Vestia roupas muito antigas, como as que só vemos em pinturas. Ele sorria maliciosamente para mim e tinha a tez pálida. Seu tom zombeteiro, longe de me irritar, me dava calafrios. Fiquei angustiada e desviei o olhar por um instante. Não mais que o tempo de um suspiro. Quando voltei a olhar o menino havia desaparecido."

Tais incidentes despertariam, dez anos depois, o interesse do jovem psiquiatra Adam Hughs, então com 33 anos, estudioso de fenômenos sobrenaturais, que mantinha freqüente correspondência com o francês Denizard Rivail (mas conhecido por seu nome espiritual, Allan Kardec). Hughs não apenas investigou a estrada, como entrou no próprio cemitério. Colheu inúmeros relatos de moradores de Windsor e chegou mesmo a montar acampamento, sem o conhecimento do prefeito local, com mais quatro auxiliáres no meio do bosque cortado pela estrada, para verificar se as visões não eram brincadeiras armadas pelas crianças vivas do vilarejo.
Passou três dias em vigília sem ver qualquer sinal de crianças, vivas ou desencarnadas. Aúnica coisa digna de nota para Hughs foi a incrível e inexplicável tristeza que se abatia sobre eles e seus companheiros, sempre no período que ia das 15:45 às 16:00 horas e a sensação de estarem sendo observados e acompanhados por "presenças inquietantes". Ao retornar a Londres, investigou os documentos que tratavam do episódio de duzentos anos antes. Espantou-se ao descobrir que a chacina ocorrera exatamente entre 15:45 e 16:00 horas (pelas horas do pôr do sol de outono) do dia 19 de novembro de 1647.
Depois de Hughs, vários pesquisadores, icluíndo o célebre Frederic W. Myers, da Society For A Psicho Research, estudaram o fenômeno das crianças do cemitério de Windsor, sem chegarem a uma resposta definitiva. No século XX, vários pesquisadores realizaram suas próprias investigações. Porém, os únicos a tirarem conclusões mais palpáveis foram o parapsicólogo Richard Wilbourn Jr. e sua esposa Susan. Em setembro de 1977, o casal instalou dez pequenos gravadores, junto com câmeras filmadoras (ambos os aparelhos colados com fita adesiva, junto a um relógio) escondidas em moitas e árvores no bosque, na estrada e no cemitério.
As câmeras não colheram nada que fosse considerado digno de mensão, porém os gravadores captaram bizarras risadas, frases e barulho de crianças brincando, no momento em que as câmeras não detectavam a menor presença próxima aos aparelhos. Captaram ainda assobios estilizados e até uma lúgubre e tristonha canção, cantarolada pela voz melancólica de uma menina. Richard e Susan relataram ainda que, na hora em que foram colhidos os estranhos sons, uma abrupta queda de temperatura se fazia sentir. Junto a ela, uma inquietante sensação de "presença invisível", acompanhada, por vezes, de uma profunda... tristeza.
Fora isso, declararam que tiveram muitos problemas com o súbito desaparecimento de pequenos objetos pessoais, como peças de roupa, relógios, canetas e sapatos que, por vezes, eram encontrados em lugares muito distantes de onde haviam sido guardados. Locais inesperados como a ponta de galhos de árvores, dentro de moitas e, várias vezes, semi-enterrados sob folhas secas. Os desaparecimentos pareciam mesmo típicas brincadeiras de criança. Com tudo isso, o casal não conseguiu fazer-se acreditar pela comunidade científica, que chegou mesmo a acusá-los de forjarem os sons.
Porém, em 1994, o psiquiatra canadense John Keynes, declarou à comunidade científica que, ao analisar as gravações do casal Wilbourn, constatou que as frases pareciam ridiculamente initeligíveis, como se fossem faladas em outra língua que não o inglês. Psiquiatra especializado em crianças com distúrbios mentais, Keynes logo observou que os sons não eram aleatórios ruídos produzidos por crianças com problemas, como a síndrome de Down, ou qualquer outro distúrbio, nem fruto de brincadeiras infantis como falar de trás para frente, ou em código, mas frases bem construídas e fluentes.
As gravações foram então passadas à análise do lingüista galês George Stenfield, especializado em dialetos antigos da Grã-Bretanha. Após três dias de criteriosa audição, Stenfield chegou a inusitada conclusão de que as crianças falavam no antigo dialeto da região de Windsor, dialeto este que não era mais falado e só aparecia em livros especializados. Declarou-se também espantado com tal fato, visto que ele mesmo levara dois anos para aprender, precariamente, a pronunciar as palavras de tal dialeto e que, crianças atuais jamais aceitariam o castigo de aprender uma fala tão gutural.
Stenfield frisou ainda que as abafadas vozes gravadas usavam o que parecia ser expressões populares. em um esforço de tradução, trancreveu algumas das frases. Elas diziam coisas comos:
"Josh 'Cabeça de Esquilo'... (intraduzível)", "(...) são 'cabeças redondas', Kay", "(...) no topo da árvore... (intraduzível)", "com o Diabo na ponta dos pés" (corram???...). E os mais impressionantes: "(...) a mulher 'cabeça redonda'... (intraduzível)", "(...) ela vem com o súdito do rei!". Richard usava cabelos longos à época da pesquisa e Susan cabelos curtos, pouco abaixo do pescoço.
Após a apresentação da análise de Stenfield à comunidade científica, houve quem defendesse uma manipulação feita por computador, logo descartada por especialistas, mas a Ciência simplesmente preferiu calar-se e esquecer o caso. Hoje porém, treze anos após o desfecho do último capítulo do bizarro caso das crianças do cemitério de Windsor, o psicólogo americano Paul Dawson voltou a analizar o caso, usando como argumento uma desafiadora pergunta à comunidade científica:

"_Que mente seria tão doentia, a ponto de construir uma mentira tão elaborada?"




Marcelo Farias - Estórias de Vovô Celestino. Gravura, cemitério de Charleston.

2 comentários:

Ana Kaya disse...

Nossa que compêndio..........
Fiquei até meio confusa, mas adorei a foto e o nome, é o mesmo nome de uma música do Iron Maiden que eu amo de paixão.

universalista disse...

Muito interessante um conto surrealista que parece real, para os dias de hoje com mundo mais aberto a vários tipos de fenómeno estranhos na área da espiritualidade.O conto poderia passar para um categoria de estórias reais.

universalista