terça-feira, 15 de janeiro de 2008

VAIDADE OU REFLEXO























Sabe uma coisa que tenho pavor, terror?... Espelho,
embora muitos o tenham como amigo.
Olhe uma vez, ele te olha de volta,
com a mesma amplitude, acuidade e magnitude.
É apavorante, arrepiador.
Para conhecer o infinito, mostre o espelho ao espelho.
A solidão, a tristeza, a angústia assemelham-se ao final,
ao fundo, da reflexão dos espelhos.

Lugar de observação, ressalva,
percepção, argúcia, consternação.
Lugar de encontros e reencontros.
Nem sempre com o apetecido,
é oi de você para você mesmo.
Único quadro em movimento,
o exclusivo em arte real, com domínio público.
Ele te mostra o sorriso que você apresentou.
A língua, a careta, o tchau.
Ele aponta seus defeitos, em silêncio.
Em sigilo, suas qualidades.

É um túmulo, um confessionário.
Além de médico, estilista e psicólogo.
Tem olhar frígido, julgador (preciso).
Ao escuro parece um portal para outro mundo.
Me deu a louca, joguei todos fora.
Não quero me ver envelhecer.
Não quero ver meus defeitos.
Já sei de cada um deles, os conheço pessoalmente
e foi ele mesmo quem me mostrou.

Joguei a cama fora, estou dormindo no chão, num colchão.
Minha mãe disse que estou louca, possuída,
e que tudo que se faz a um espelho reflete de volta.
_Não estou louca, estou me livrando de um fuxiqueiro!

É mudo sim, mas fala meus defeitos pra mim,
que não sou muda, nem tenho língua presa.
Prefiro dormir no chão a uma cama com espelhos,
que fica mostrando meu cabelo ruim,
meu nariz grande, minha pele negra, meu pé quarenta.
Minhas espinhas!

Quebrei todos!
O do banheiro, da sala, próximo à mesa de jantar
e, principalmente, do meu quarto.
Quebrei todos...
e li hoje que quebrar espelhos traz sete anos de azar... Será?




Weslei Ribeiro. Ilustração: Mel Lisboa em ensaio para a revista Playboy, Editora Abril, 2004.

Um comentário:

MARCELO FARIAS disse...

Este poema poderia ter sido feito por Madame Satã.